quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

PARANDO O TEMPO

José Augusto Fontes

Foi assim, penetrei no teu futuro, atravessei, trouxe umas lembranças na bagagem, entrei, acho, na contramão do teu rumo, dos teus sentidos, pensando em não explicar, em não compreender, depois peguei a linha, soltei o fio do tempo, sendo tomado pelo prazer de agradar, pelo inesperado e longo prazer de dar boas-vindas à surpresa. Foi mesmo sem explicação nem entendimento que possuí teu tempo e invadi tuas pernas, o que fez com que nenhum de nós continuasse ou voltasse. A continuação possível, naquele momento meio eterno, foi ficar parados, num vai-e-vem quieto. E para parar, seguramos nas nossas mãos, por onde escorria o passado, apertando o presente.

Vivemos assim até agora, quando estou aqui, sem jeito, lembrando de tudo, pensando na nossa caminhada, querendo mais e sabendo que dizer a nossa história só cabe a ti, com teu inevitável silêncio, com tuas mãos de condão, com a imensidão dos teus olhos abrindo um presente que me dá o futuro. E o silêncio é agora, está aqui, deitado nas costas do prazer, sonhando nosso amor vindouro, quando estivermos na dimensão do inexplicável, quando nosso abraço não alcançar entendimento com nenhuma partida, e esse presente atravessar nossa vontade de aceitar o que vem e o que vai, quando movimentar nossa vontade de parar o tempo e quando segurar com força nossa ilusão, por onde vai escorrer outro passado, por onde chegará um futuro rápido, que já vai quase passando do próprio conceito, enquanto tua mão prende meu pensamento, que partia no rumo do teu jeito de gesto mudo.

Tudo o que penso cala, quando vejo em ti uma boa história para continuar. Será que o tempo desconfia disso? E assim vivemos, na imensidão do mistério, na exatidão da nossa intersecção, levando a bagagem que nos cabe, sabendo ser melhor viajar do que apenas chegar. Assim vamos, seguimos no mesmo ponto de encontro, o futuro é nosso velho conhecido, jogamos com ele e já saímos batidos. Em nosso presente, a fita passa a imagem renovada da trapaça, dona perene da razão, nessa partida sem final.

E agora está assim, um presente explica todos os rumos, a compreensão da brincadeira do futuro quer a contramão antiga, no sentido que está na chegada ao destino e que está também além do seu tempo, do teu, do nosso, do incessante jogo, da incansável fantasia. A indefinição do amor vence a razão e divaga querendo vencer o tempo, querendo vencer a voz, para ser possível dizer para a ilusão que o tempo acaba com tudo que há, que havia. E fica assim, na indefinição, a ilusão de querer vencer.

É assim, o silêncio caminha para nada, é caminho para nenhum outro rumo, é caminho para ficar, não há para onde ir, não há de onde voltar, inexiste surpresa no passado. Parar, perseguir ou deixar estar, em tuas mãos, as boas-vindas ao nosso futuro, que ainda nem partiu, que nem tem bilhete para chegar, é nisso que gastamos o tempo, que nem é nosso, é de ninguém. E a chegada, já passamos dela, sem notar sequer que estávamos indo, agora que voltamos.

Ir ficando, parar é o sentido possível, sem que nenhuma dinâmica seja maior que a nossa, nesse infinito instante que quer ultrapassar o tempo, nesse esgotado momento que registra o conceito de destino, preso dentro dos teus olhos que libertam a idéia de andar ainda mais para dentro, estar lá e cá, vivendo nossa interminável poesia, cuja expressão está em teu gesto, rindo do tempo, do texto e do tecido, simplesmente, encantando e explicando tudo.

Todo o tempo que me cabe está em teus limites. E nos das minhas sementes. É o que me digo quando ouço que a vida é uma árvore. Por isso penetrei teu futuro e semeei em tuas pernas, para colher outra vida e juntar às que já tinha. Essa luz me clareia o caminho e eu preciso, pois há muito caminho numa floresta, nesta minha floresta, só agora, com várias clareiras. Por isso essas matas me dão teus olhos para seguir, essa cor me alumia.

Mas tudo isso só sei ver e sentir, sabendo que não sei dizer sem mentir, por isso parei o tempo, desliguei a surpresa, enganei as regras com as quais furtava todo o eterno jogo, com as quais vencia minha vontade de vencer, e dei meus passos à tua estrada. Adotei esta fábula e digo para dentro, contando o que nem sei se realmente vivemos, se viveremos. Acho que por isso, o teu infinito calou o meu silêncio. É também por isso, imagino, que a poção com a qual venho enganando o tempo, ficou cheia de palavras.

José Augusto Fontes é acreano, poeta, cronista e juiz de direito

5 comentários:

Êidina Queiroz disse...

Prezado Altino Machado, ha quanto tempo nao faço nenhum comentario neste blog... Este Dr. Jose Algusto Fontes é um poeta dos bons, só poderia ser acreano rsrs. Aqui no Rio tem um juiz que sua sentença é feita em versos e na epoca em que fui estagiaria, tinha o Dr. Eduardo Mayr, juiz da 33ª Vara Criminal, hoje, desembargador aposentado, que baseava a sentença, sempre, numa passagem biblica, ficava uma peça linda. Em abril estarei de visita em RBR, revendo meu pedaçinho querido de chao. Abraço fraterno.

Katiana Assunção disse...

Que LINDO... adorei!

Katiana Assunção disse...

Ah, e realmente... grande poeta! ;)
Gostaria de ter toda essa inspiração.

Anônimo disse...

Acompanho esse jovem rapaz, de forma remota, há muito tempo, desde o tempo em que era funcionário do TJ Acreano...Um cara sério, humilde, regado de bons princípios e sempre disposto a deixar uma atmosfera de muito sinergismo por onde passa, percebia isso nos comentários de bastidores que seus funcionários mais próximos faziam. Além disso, um poeta maravilhoso. Adorei o texto.
Márcio Menezes

Anônimo disse...

Voce juiz de direito;não tem o direito de parar o tempo.Mas pode;tudo dentro da lei condenar quem inventou o relogio que faz o tempo passar.BETO MINEIRO