Leia o artigo de Jorge Viana, ex-prefeito de Rio Branco e ex-governador do Acre, publicado hoje no Globo, sobre os 20 anos do assassinato de Chico Mendes. Está piegas. Viana conclui que a morte do seringueiro "parece que foi ontem". Prefere enxergar o aparente do aparente, sem qualquer crítica, porque a política subtrai a indepedência ou isenção dele para tanto. Sem sofisma: já se passaram 20 anos. É muito tempo, sim. Desses 20 anos, 10 com o Acre governado pelos companheiros petistas de Chico Mendes. Mais um motivo para se considerar a reflexão crítica (veja) de Antonio Alves. Segue o artigo:
Mataram Chico Mendes! Parece que foi ontem
Jorge Viana
Passei o 22 de dezembro último em Xapuri, onde participei da caminhada e da missa em memória dos 20 anos sem Chico Mendes. Tenho sempre a sensação de que a morte do Chico aconteceu ainda há pouco. Parece que foi ontem que recebi aquela notícia perturbadora. Até hoje, tenho dificuldade de entender se isso ocorre pela saudade de um amigo querido ou pela atualidade de seu legado.
Ele não só despertou a atenção do mundo para a Amazônia, como inovou o debate ambiental introduzindo um elemento absolutamente novo nessa questão: os povos da floresta. Foi ele quem fez germinar o conceito do socioambientalismo.
Nos anos 70 e 80, os governos vendiam a Amazônia como “uma terra sem homens para homens sem terra”. Uma dupla maldade. Famílias eram despachadas para a Amazônia apenas para aliviar tensões rurais e urbanas no Sul e Sudeste, sem qualquer política pública que lhes garantisse um futuro. E a “terra sem homens”, além de ocupada por uma população tradicional, não era simplesmente uma terra, porque sobre ela repousava um dos mais valiosos patrimônios da humanidade: a maior floresta tropical do planeta.
O Chico foi o primeiro a fundamentar a defesa da floresta na defesa dos povos da floresta. Aí surgiu o conceito de reserva extrativista. Era algo inovador, “um jeito novo de caminhar”, como escreveu o poeta Thiago de Melo. Ele abriu a possibilidade de mais qualidade de vida na floresta, sem desmatar para “abrir novos caminhos”.
Às vezes, eu mesmo não entendia quando o via gastando horas com técnicos, jornalistas, dirigentes sindicais ou de ONGs, pessoas de toda parte do mundo, para mostrar coisas tão simples da floresta, como uma pequena planta rasteira ou uma majestosa castanheira. Ele dissertava sobre a beleza, mas também sobre o valor da floresta em pé, as possibilidades econômicas e sociais que a exploração sustentável abriria para todos.
No começo dos anos 80, muita gente boa ainda desconfiava da ecologia. O Chico defendia idéias até então estranhas no mundo sindical. Ele mostrou que, assim como não adiantava trabalho sem casa, não daria para viver muito tempo com casa sem ambiente. Revelou uma massa de trabalhadores da floresta que tinham árvores e igarapés como linha de montagem. A CUT acabou aceitando o discurso socioambiental do líder seringueiro e aprovou a proposta de reforma agrária diferenciada para a Amazônia.
Hoje, quando o mundo tem como grande desafio o enfrentamento das mudanças climáticas, suas idéias de um ambientalismo social dão ao Brasil uma importante vantagem comparativa no concerto das nações. Tanto maior, quanto mais a sustentabilidade se impõe como condição para o desenvolvimento.
O presidente Lula, que conviveu muito de perto com o Chico, se mantém atento ao legado do companheiro, colocando suas idéias no Ministério do Meio Ambiente que foi ocupado por quase seis anos por uma discípula do Chico, Marina Silva. Ela criou o Instituto Chico Mendes, o Serviço Florestal Brasileiro, e ampliou em muitas vezes o número de reservas e áreas de conservação. Marina formulou, implementou e cuidou das políticas ambientais, ganhou respeito e conquistou aliados dentro e fora do Brasil. Atualmente, Carlos Minc, também amigo de primeira hora do Chico, está levando adiante essas políticas visando a diminuição do desmatamento, preços mínimos para produtos florestais, manejo florestal comunitário e apresentação de metas para a redução das emissões a partir das queimadas.
No entanto, ainda tem muito a ser feito pela floresta e pelos povos da floresta. O legado do Chico Mendes precisa estar ainda mais presente na vida das pessoas, nas empresas, na sociedade e no próprio governo.
Agora, voltando a pensar se a presença do Chico vem mais pela saudade ou pela atualidade do seu legado, agradeço a Deus o privilégio de ter convivido com essa pessoa tão extraordinária, mesmo na fase mais delicada da sua vida - seus últimos anos, seus últimos dias.
Vinte anos depois, o que mais lamento é não ter o Chico para celebrar com a gente as coisas boas que vieram como fruto de suas idéias e seus ensinamentos. Ele, que foi premiado na ONU, sabia reconhecer e festejar mesmo as conquistas mais singelas.
Lembro-me do nosso último encontro em Rio Branco. Ele vinha do Rio de Janeiro. Pedi para ele ficar aqui. Não adiantou. Tudo o que ele queria era passar o Natal em casa com a sua família e seus amigos. Daí falei que ele poderia ir com o novo caminhão adquirido pela cooperativa com dinheiro do BNDES, um velho sonho do movimento. O rosto do Chico se iluminou e ele ficou mais um dia em Rio Branco. Foi para Xapuri, encheu o caminhão de crianças e rodou a cidade inteira, soltando foguetes e festejando.
O dia seguinte foi 22 de dezembro de 1988. Parece que foi ontem.
2 comentários:
Jorge Viana através de malabarismos consegue homenagear Chico Mendes sem mencionar aqueles que o mataram. Claro, hoje eles são seus amigos. Quem não se cansou de ver o Jorge montado a cavalo de chapéu de cowboy nas carreatas da Expoacre?
O problema de quem lê esta homenagem é não saber por absoluta falta de informação se o Chico Mendes morreu de picada de cobra, nó nas tripas, acidente aéreo ou ataque de marcianos. Tenta-se desvincular a morte dele de sua causa pra não desagradar ninguém e ficar bem com todo mundo.
Tá certo, tem eleição em 2010...
quando o brasil tratar a amazonia como brasileira, vamos conseguir respeito das outras naçoes em relaçao aquilo que nos pertence
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