terça-feira, 9 de setembro de 2008

TECENDO OS NÓS DAS REDES

Marina Silva

No dia 28 de julho tratei neste espaço da expansão política que se dá via internet (leia aqui), beneficiando-se da notável abertura e horizontalização dessa forma de comunicação e colocando em sintonia uma verdadeira multidão de emissores de mensagens.

Chamei este fenômeno de Polinet, em contraposição ao Politburo, a instância máxima de poder na antiga União Soviética, que ficou conhecido como sinônimo de grupos que comandam a política de forma altamente verticalizada, com mão de ferro, de cima para baixo.

No final do artigo, lembrei o cuidado que se deve ter para não mistificar a internet porque ela também é um campo de delinqüência e comportamentos destrutivos. Mesmo assim, deve ser valorizada e explorada cada vez mais como espaço de participação política e de exercício de cidadania.

Agora volto ao tema, para exemplificar o uso da internet como ferramenta de redes que têm as questões ambientais no centro de suas ações.

O sociólogo espanhol Manuel Castells estuda a sociedade atual como uma sociedade globalizada marcada por profundas mudanças nos seus sistemas estruturantes e nas relações entre grupos e pessoas, mediadas por uma revolução tecnológica na área da informação. Essa sociedade, diz Castells, organiza-se basicamente na forma de redes, o que se torna possível pela expansão das tecnologias de informação.

O conceito de redes de Castells é, em princípio, bem simples. Ele diz que "rede é um conjunto de nós interconectados". Mas se olharmos a sociedade atual, veremos como essa idéia é útil para entender a maneira complexa como nos conectamos com múltiplos interlocutores, tanto na vida privada quanto no exercício profissional e na vida pública de maneira geral. Para Castells, a principal característica da rede é que ela é uma estrutura aberta, em constante expansão, o que se dá pela integração de novos nós, desde que compartilhem os mesmos códigos, como por exemplo, um conjunto de valores ou um objetivo.

Isso vale para a economia, a cultura, para todos os setores e formas de organização da sociedade. Como instrumento de organização social, a estrutura de redes tem sido decisiva para potencializar ações que teriam impacto muito reduzido se fossem feitas por uma única entidade ou segmento. Tem sido também fundamental ao colocar em sintonia redes de diferentes origens, provocando um aprendizado intenso, sobretudo no que diz respeito à convivência e sinergia entre diferentes, desde que eticamente alinhados em seus propósitos.

Essa sinergia de redes pode ser observada na formação de processos de governança, nos quais a decisão de interesse público passa pela participação de múltiplos setores no debate e na elaboração de propostas.

Da área socioambiental, uma das pioneiras no estímulo à formação de redes no campo dos movimentos sociais, vêm os exemplos que quero apresentar. São quatro redes de naturezas distintas na sua origem, composição e objetivos.

A mais antiga é a REBRIP, a Rede Brasileira de Integração dos Povos, criada em 1998. É uma articulação de ongs, movimentos sociais, entidades sindicais e profissionais. Nasceu para ser instrumento de discussão das diversas integrações regionais, da ALCA ao MERCOSUL. Sedia o capítulo brasileiro da Aliança Social Continental, rede que articula ongs e movimentos sociais das Américas para combater os tratados de livre comércio.

Ao longo do tempo, a REBRIP acabou incorporando a questão ambiental como uma das suas maiores preocupações, embora na origem estivesse desvinculada dela. Hoje acompanha de perto os tratados de livre comércio e na suas relações com o meio ambiente. A Reprib é uma demonstração do crescimento dos temas ambientais nos movimentos sociais e ongs não ambientalistas, reforçando a idéia de ligação necessária e visceral entre questões sociais, econômicas e ambientais.

Já a Rede Brasileira de Ecossocialismo foi criada no Forum Social Mundial de 2003. Ela representa outro elemento de evolução da questão ambiental. Nasceu sob o signo da Ecologia Política, tentando responder a lacunas e fragilidades no trato dos temas ambientais nos partidos e movimentos de esquerda. Essa rede aglutina pessoas que acreditam na junção entre a busca do socialismo e o ambientalismo, mas constatam que em muitos setores da esquerda esse ainda é um assunto considerado secundário. No ano passado, em Paris, foi criada a Rede Ecossocialista Internacional.

As outras duas redes têm a ver diretamente com a ação conjugada da sociedade e do Estado para avançar em iniciativas de caráter socioambiental. A primeira delas é a REJUMA, Rede de Juventude pelo Meio Ambiente, criada dentro das Conferências nacionais de Meio Ambiente, principalmente a partir da I Conferência Infanto Juvenil, realizada em 2003.

Para além de uma rede de educação ambiental entre os jovens, a REJUMA propõe um maior engajamento da juventude na defesa da sustentabilidade do planeta e reivindica políticas públicas que articulem a questão ambiental com os temas da juventude, nos seus mais diversos segmentos. Está ligada à idéia de protagonismo juvenil, que tem no jovem cidadão uma fonte de iniciativa com liberdade e responsabilidade social e ambiental.

A Rejuma tem apoio dos ministérios da Educação e do Meio Ambiente e forte articulação nos estados, por meio dos Cjs, os Coletivos de Juventudes pelo Meio Ambiente.

A segunda é a Rede Brasileira de Agendas 21 Locais. Tem sua origem na Agenda 21, um dos principais documentos aprovados na Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, a Eco-92, com o objetivo de ser um guia prático de ações para materializar o conceito de desenvolvimento sustentável em cada país e em âmbito global.

Há programas de Agenda 21 Local na maioria dos países. No Brasil ela é particularmente ativa. Apoiada desde o seu nascedouro pelo Ministério do Meio Ambiente, reúne os fóruns de Agenda 21 locais, espaços de democracia participativa e de construção de consensos para o desenvolvimento sustentável local, entre ongs, movimentos sociais e comunitários, iniciativa privada e poder público municipal, estadual e federal. A Rede Brasileira de Agendas 21 Locais está se tornando um instrumento importante para troca de experiências e aplicação de soluções sustentáveis a problemas locais.

E por falar em Politnet, cada uma dessas redes fornece links. Assim, quem entrar nos seus sites terá acesso a um mundo de articulações e de possibilidades de informação e engajamento na área socioambiental. Os endereços são: www.rejuma.org.br; www.redeagenda21local.org.br; www.rebrip.org.br .

Marina Silva é professora secundária de História, senadora pelo PT do Acre, ex-ministra do Meio Ambiente e colunista da Terra Magazine.

Um comentário:

Lucas Silva disse...

As questões ambientais estão cada vez mais ligadas a tal 'Politnet'.