terça-feira, 22 de janeiro de 2008

METENDO A COLHER DE PAU NO MUNGUNZÁ

Simão Pessoa

Eu devo ter sido um dos poucos cabocos da região a não ter assistido a “matéria” veiculada no jornal Nacional, da Rede Globo, sobre a “Expedição Juruá Sempre”, feita por parlamentares acreanos no início do mês. Mas como sei que tipo de jornalismo canalha a “Vênus platinada” pratica diariamente, faço uma idéia de como a “matéria” foi produzida e exibida.

Pra ser sincero, desde a edição vergonhosa que fizeram daquele debate Lula-Collor (alguém ainda lembra?) há quase 20 anos, as notícias veiculadas pela rede Globo entraram no meu index de coisas proibidas até o final dos tempos. Ainda prezo pela minha sanidade mental – e seria de bom alvitre que mais gente fizesse o mesmo.

Às vezes, entre um cigarro e outro, fico matutando sobre que tipo de pessoa assiste (ou, muito pior, costuma levar a sério) as baboseiras apresentadas por Cid Morengueira e Sergio Chapolin (ainda são os âncoras-palhaços do noticioso ou já foram pro formol?) durante o horário nobre. Saber que o JN ainda é o principal informativo do país para a maioria dos brasileiros costuma me deixar macambúzio e levemente deprê. Tenho muita pena de quem assiste aquela josta.

Aliás, se grande parte da população brasileira, incluindo a cabocada de nossa região, já tivesse assistido ao documentário “Muito além do Cidadão Kane”, de Simon Hartog, produzido em 1993 pelo canal 4 da BBC, eu nem precisaria fazer esse prolegômeno. Sim, o documentário discute o poder e a filhadaputice da rede Globo e teve sua exibição proibida no Brasil. Mas dá pra ser “baixado” na web. Cacem.

De qualquer forma, resolvi meter minha colher de pau no panelão de mungunzá dessa discussão bizantina e – por que não? – meio provinciana. A “Expedição Juruá” deveria servir de exemplo para os parlamentares amazônicos, que só costumam ver as comunidades ribeirinhas olhando de cima, a bordo de aeronaves (em época de eleição, evidentemente, a história é outra).

O relato comovente do jornalista Leonildo Rosas [leia aqui], por exemplo, deveria ser matéria obrigatória nas escolas públicas, nas discussões das academias, nas mesas de botecos, nos sindicatos e associações de moradores, além de ser replicado ad nauseaum em todos os blogs que estão discutindo seriamente a problemática amazônica.

Entre outros méritos, o relato/reportagem de Leonildo faz um contraponto perfeito à distorção midiática vinda do sul-maravilha, eivada de preconceitos contra os nativos. Sem dourar a pílula, o repórter mostra que o rei está nu, que as políticas públicas não chegam (e não vão chegar se não houver luta e gritaria) aos mais desassistidos, que ainda há muito pra ser feito para proteger a floresta e que o caboco amazônico é, acima de tudo, um “brabo”. Quem nem siri na lata. Sobrevive de teimoso.

Causa perplexidade perceber que no lugar de estarem discutindo seriamente o que fazer para incluir essas populações marginalizadas no desenvolvimento socioeconômico da região, alguns formadores de opinião acreanos estejam mais preocupados com picuinhas, como saber que tipo de bebida foi servida a bordo da embarcação e quem pagou pelo bolo de aniversário de um deputado. Isso não passa de cabotinismo estéril, hipocrisia travestida de “boas intenções”, vôos acrobáticos em uma piscina vazia.

O deputado Edvaldo Magalhães (PCdoB), a quem não conheço pessoalmente, está de parabéns. Em pleno recesso parlamentar, ele reunir meia dúzia de parlamentares, colocar a tropa em um barco e enfrentar mais de 4 mil quilômetros de “estrada aquática”, convenhamos, é uma verdadeira façanha. Quantos políticos podem dizer que conhecem a Amazônia sem terem feito uma viagem assim?

Os bem intencionados (sim, o inferno está cheio deles) podem argumentar que “um médico não precisa pegar malária para conhecer os sintomas de doença” para justificar o fato de “que ninguém precisa fazer uma viagem dessas para descobrir o que todo mundo já sabe”. Claro, isso é argumentação meia-boca de iracundos (estão no quinto círculo do inferno de Dante). O fato é que a presença física de parlamentares nessas comunidades perdidas não só lhes aumenta a auto-estima como reacende a esperança de que dias melhores virão.

Plagiando Milton Nascimento, na canção “Nos bailes da vida”, “todo parlamentar tem de ir aonde o povo está”. E foi isso que os deputados acreanos fizeram. Criticá-los, quem há de? Eles fizeram o certo, estão combatendo o “bom combate”. Se o resultado prático da expedição ainda vai demorar a sair (políticas públicas não são construídas da noite pro dia), são outros quinhentos. O mais importante é que o deputado comunista colocou a pedra pra rolar. Não é pouca porcaria.

Simão Pessoa é jornalista e escritor amazonense, editor da revista Amazonia Viva. Clique aqui e leia o blog dele sobre arte e cultura.

7 comentários:

Fora disse...

Altino, não tem como você conseguir e postar essa matéria não, hein, eu também não vi esse diacho.

AJ

ALTINO MACHADO disse...

Arison, o link está no post no qual comentei a reportagem da Folha.

disse...

Olá Altino,
Eu gostari encontrar informaçAô sobre a expediçâo. Agora pegué o artigo da pagina 20, mais gostaria de saber onde conseguir maior informaçâo.
Lei o seu artigo e foi un prazer reflexivo.
Adoro Amazonia si você podese me informar eu intentaria fazer alguma coisa con tudo isso.

Obrigada.

Saravá.

Saudades do Acre disse...

Altino, este eh apenas um teste. Estou acessando o blog via celular e enviando este comentario. Grande abraço.

Unknown disse...

Celular novo, hein, saudade do acre?

Saudades do Acre disse...

Pois é, Mário, a gente tem que procurar evoluir prá se aproximar mais dos amigos.Vou dar um jeitinho de catar seu telefone prá conversar acreanidades com você. Gosto de quem sabe das coisas e tenho certeza que voce sabe. Devo estar em Rio Branco antes das águas baixarem e faço questão de uma prosa com você. Espero que me conceda uma audiência...rsrsr. abração.

Unknown disse...

...pois é, muitas saudades do Acre, mesmo!