quarta-feira, 28 de fevereiro de 2007

FORÇA DE BLOG

Altino

A diretoria do Detran inteira mandou telefonar para minha secretária por causa do meu relato em "Situação do Detran". Entregaram pessoalmente a carteira de motorista da Maria Íris Célia de Oliveira. Foi o fim de um longo drama. A responsabilidade foi transferida para o "atendimento", claro, onde não souberam informar a moça corretamente.

Seu blog, hein? Está com uma força incrível. E os jornais impressos foram para o espaço.

Valeu.

Abração,

Fátima Almeida

Fátima querida, a força é decorrente da visita de milhares de leitores que prestigiam o blog, mas a vida de jornalista não costuma ser fácil. Lembra de quando vocês estiveram no Ministério Público e ouviram que ali “nada poderia ser feito” porque só atendem “questões coletivas”?

Veja o meu caso: hoje cedo, às 8h30, fui notificado pela promotora de justiça Kátia Rejane de Araújo Rodrigues, da Infância e da Juventude, para tratar, às 10 horas, de denúncia contra este blog, formalizada pela família da professora Íris Célia Cabanelas Zannini, em decorrência do jovem que publicou foto no Orkut montado naquela estátua do poeta Juvenal Antunes que existe em frente ao prédio da Fundação Cultural do Acre.

A pressão é para que eu remova o post "Juvenal", junto com a foto, sob pena de ser alvo de uma denúncia em processo administrativo que pode me custar, em caso de condenação, multa de três a 20 salários mínimos. A notificação é assinada pelo colunista social Moisés Alencastro, do jornal Página 20, que também é o secretário geral da Coordenadoria da Infância e Juventude do Ministério Público do Acre.

O jovem cometeu aquele "ato de heroísmo", divulgou a foto na internet, numa rede de relacionamento frequentada por 45 milhões de pessoas, mas quem pode acabar sendo condenado a pagar multa ou até ser preso sou eu. Declarei à promotora o que já está relatado de modo transparente no blog.

Em tempo, Fátima: desde outubro a Secretaria de Segurança do Acre não emite aquelas cédulas ou carteiras de identidade. O fornecimento das mesmas é um serviço terceirizado. Custa R$ 0,45 ao governo cada documento. Deixaram de pagar e por causa disso a empresa suspendeu o fornecimento. Quem necessita do documento e paga R$ 10,00 terá que continuar a esperar.

A imprensa acreana, que consome milhões anualmente, prefere ignorar o que interessa verdadeiramente ao cidadão. É por issso que temos cinco jornais impressos praticamente sem leitores.

Chique a
Maria Íris, hein? Estou pensando em pedir carona a ela e emprego a você.

O jeito é cantarolar "Mistério do Planeta", de Galvão e Moraes Moreira:

"Vou mostrando como sou e vou sendo como posso. Jogando meu corpo no mundo, andando por todos os cantos.

E pela lei natural dos encontros, eu deixo e recebo um tanto. E passo aos olhos nus ou vestidos de lunetas.

Passado, presente, participo sendo o mistério do planeta.

O tríplice mistério do "stop", que eu passo por e sendo ele no que fica em cada um.

No que sigo o meu caminho e no ar que fez e assistiu. Abra um parênteses. Não esqueça que independente disso eu não passo de um malandro. De um moleque do Brasil, que peço e dou esmolas.

Mas ando e penso sempre com mais de um, por isso ninguém vê minha sacola".

ANÍBAL DINIZ

Caro Altino

Não faço idéia dos motivos que levam o jornalista Cláudio Humberto a sempre publicar notas em tom ofensivo contra o ex-governador Jorge Viana e seu irmão, o senador Tião Viana, do qual tenho a honra de ser primeiro suplente.

Não resta dúvida de que as fontes que alimentam Cláudio Humberto de informações sobre a política do Acre são desqualificadas. Se o jornalista em questão tivesse o cuidado de checá-las, não teria publicado repetidas vezes tantas desinformações.

Desincompatibilizar-se de cargos públicos para candidatar-se a cargos eletivos 6 ou 3 meses antes do dia da eleição é preceito constitucional básico, e foi cumprido integralmente por mim e pelos demais candidatos da Frente Popular que ocupavam cargos no Governo do Acre.

Aliás, no ato de registro de candidatura junto ao Tribunal Regional Eleitoral, o desincompatibilizado deve apresentar cópia do decreto de exoneração e a prova de sua publicação no Diário Oficial do Estado.

Portanto, Altino, fique certo de que seu amigo suplente Aníbal Diniz estava devidamente desincompatibilizado durante os 3 meses que antecederam ao dia da eleição, e que o mandato conferido pelo povo acreano ao senador Tião Viana não corre o menor risco.

Um grande abraço,

Aníbal Diniz

O jornalista Aníbal Diniz é assessor especial do governador Binho Marques.

MANDATO EM RISCO?

Jornal A Gazeta deixou de publicar hoje a coluna do jornalista Cláudio Humberto por causa das seguintes notas:

O senador Tião Viana (PT-AC) pode ter a reeleição impugnada na Justiça Eleitoral: é que o suplente Aníbal Diniz não se desincompatibilizou do cargo de assessor da Secretaria de Desenvolvimento das Cidades, no Acre. O curioso é que a nomeação de Diniz, ex-secretário de Comunicação de Jorge Viana, é de 24 de abril de 2006, mas só foi publicada no Diário Oficial – assinada pelo ex-governador – nove meses depois, em 5 de janeiro último.


Mancada
Jorge Viana garantiu nove salários para Aníbal Diniz, mas esqueceu de inventar outro ato afastando-o três meses antes da eleição, como diz a Lei.

Boquinha cara
O ex-governador Jorge Viana garantiu a boquinha ao ex-secretário Aníbal Diniz, mas deixou o irmão, senador Tião Viana, pendurado na brocha.

Crime eleitoral
Para especialistas, Jorge Viana pode ter escondido da Justiça Eleitoral que o suplente de seu irmão estava inelegível, o que também é crime eleitoral.

Cláudio Humberto já demonstrou intolerância para com os irmãos Viana e por conta disso já divulgou na coluna desinformação das fontes dele no Acre. Agora é esperar o devido esclarecimento do Governo e da Frente Popular do Acre.

VOCES VIRAM?

Da coluna de Mônica Bergamo, da Folha de S. Paulo:

O presidente Lula tem adotado um método de "tortura amazonense" quando faz reunião com ministros e assessores que estão loucos para saber da reforma ministerial.

Começa sempre os encontros dizendo: "Vocês viram a minissérie "Amazônia" [da TV Globo, dirigida por Glória Perez] ontem? Eu e Marisa vimos". E começa a discorrer sobre as desventuras dos personagens.

O interino Daniel Bergamasco erra ao citar a autora Glória Perez como diretora. E a técnica da tal tortura amazônica deve ter sido ensinada ao presidente por Jorge Viana e Binho Marques.

terça-feira, 27 de fevereiro de 2007

PERPÉTUA ALMEIDA

Prezado Altino.

É minha rotina diária visitar este blog, que é um brilhante espaço acreano.

Quanto ao assunto dos péssimos serviços da Brasil Telecom [leia mais aqui], que detém o monopólio do serviço de banda larga no Acre, estou encaminhando algumas providências aqui na Câmara.

Como a mesma é permissionária de serviço público, estou requerendo que a Comissão de Fiscalização e Controle faça minunciosa averiguação na prestação de serviços da mesma.

Também irei na presidência da Anatel exigir que eles se posicionem e cumpram o dever de regulamentar melhor o serviço da empresa.

Reitero que estou aberta à indicações que você e seus leitores achem pertinentes.

Saudações acreanas,

Perpétua Almeida

Perpétua Almeida é deputada federal pelo PC do B. A iniciativa merece o apoio irrestrito dos demais membros da bancada acreana, pois cada usuário da Brasil Telecom no Acre tem sofrido individualmente com a precariedade dos serviços e do atendimento. É bom que os leitores se manifestem.

REPÚBLICA DO ACRE


Até o final do século 19, a região era um canto esquecido da Amazônia que não interessava a ninguém. Mas, com o surto da borracha, se transformou num paraíso que, em menos de dez anos, foi palco de uma série de conflitos que quase levaram Brasil e Bolívia à guerra

Leia a reportagem completa de Fernando Granato no site da revista Aventuras na História.

TERRA DE TACANHOS



A advogada Daniela Zannini (foto) não gostou de ver no blog a foto que o sobrinho dela publicou no Orkut, montado na estátua do poeta Juvenal Antunes. Ela deixou na página do jovem a seguinte mensagem:

- Que tristeza me deu ao ler aqueles comentários no tal Altino Machado. Meu filho, controle os ímpetos da adolescência...principalmente nessa terra pequena aí, cheia de pessoas más, que só querem detonar com a vida dos outros. Se cuide! Eu sei que vc não é um 'mongolóide', tampouco um 'vândalo'...e foi por isso me doeu tanto ler aquilo. Como pode alguém falar de quem não conhece? Fique com Deus...estude e trabalhe muuuuito para, um dia, sair dessa terra de tacanhos! Beijos.

Os ancestrais de Daniela Zannini, que vive na Cidade Maravilhosa, ajudaram a construir a "terra de tacanhos".

SITUAÇÃO DO DETRAN

Fátima Almeida

O governador Arnóbio Marques precisa saber o que está acontecendo no Detran. Por dever de cidadã sou obrigada a fazer um relato de uma situação infame enfrentada por Maria Íris Célia de Oliveira, a moça que trabalha há cinco anos na minha casa. Ela fez curso para motorista na auto-escola Trovão e em seguida foi aprovada em todos os exames em maio do ano passado.

Após meses recebendo apenas uma licença provisória, teve a infeliz notícia de que não poderia receber a carteira porque haviam perdido uma das provas no próprio Detran e por isso deveria fazer outra prova, sem pagar. A ordem vinha da diretora do órgão, pessoa a quem temos a maior consideração, Arnete Guimarães, em conjunto com a corregedoria.

Face ao absurdo da situação procuramos o Procon, afinal todas as despesas para adquirir a carteira foram pagas de nosso bolso. Para nosso espanto fomos encaminhadas ao Juizado de Pequenas Causas, já que o Procon, conforme nos falaram no atendimento, não pode resolver esse tipo de situação. Mas as despesas foram efetuadas em troca de serviços.

No Juizado, nos mandaram embora, pois ali não é possível prestar queixa contra o Estado, foi a resposta. O próximo passo foi em direção ao Ministério Público, onde novamente ouvimos que ali também “nada poderia ser feito” porque só atendem “questões coletivas”.

Mas nos orientaram a procurar o Dr. Renato, um dos diretores do Detran. A visita ao Dr. Renato foi rápida porque ele parecia extremamente ocupado. E além disso, fez suas próprias queixas de que “trabalhavam muito, davam o máximo de si, mas infelizmente, existiam funcionários no Detran que estavam boicotando o serviço”.

Após isso, uma grata surpresa: a prova foi encontrada. E então pensamos que tudo estava finalmente resolvido. Ontem, pela manhã, Maria Íris Célia a moça de quem falo, foi buscar sua carteira. Para surpresa nossa, a carteira não foi encontrada no Detran.

Disseram a ela que procurasse o dono da auto-escola, pois o mesmo teria levado “um monte” de carteiras. Ela foi ao local da escola e ali ouviu a resposta de que não era verdade, a carteira não se encontrava com eles.

E agora? Existe alguma organização clandestina e criminosa agindo no Detran em Rio Branco? Não sabemos mais o que fazer nem a quem recorrer.

À PUTANESCA

Leila Jalul

Carmélia e Ava Gardner não se conheceram, nem na telona. A beleza e a semelhança entre as duas, no entanto, faria qualquer cristão imaginar que estava vendo coisas. Nem sei qual foi o lugar onde Ava nasceu.
De Carmélia, sei que nasceu no Acre, viveu no Acre e morreu no Acre. Isso é o bastante. Que nem eu. Se fez e se criou na curva do tempo. Num lugar onde o remoto ainda queima e o futuro era desprovido de porvir.


Conheci Carmélia quando comprei uma casa numa rua com nome de um general qualquer, sem sobrenome e sem número. Como vizinhos um tanto de gente também sem sobrenome. Lugar perfeito para esconder minha identidade sem desejo de aparecer. Coisa boa.

Como alternativa de me enfiar no meio das vizinhas lavadeiras, nada mais restava senão aproveitar os olhos d’água e lavar meus trapos, ali, juntinho, e, numa conversa de comadres, portar-me como uma delas. Tempos bons.

Carmélia era fera. Enquanto eu lavava uma bacia, ela já vinha com o angu. Nada de Confort, nada de cheiros, de clareadores. Tudo no muque. Uma tábua na frente, dois nacos de sabão Zebu, e lá estava tudo lavadinho, pronto para secar e passar, fazer a trouxa, embrulhar com jeito numa toalha felpuda, prender com dois alfinetes de segurança e entregar para a patroa. Cacete de agilidade.

Aí, no meio dessa algazarra, resolvi fazer a horta comunitária. Precisava fazer com que aquelas meninas aprendessem o valor da berinjela, da rúcula, do agrião de terra molhada, do espinafre, da azedinha, do manjão gomes. Precisava dizer da riqueza dos talos, das vitaminas do sopão de ossos, do caldo engrossado com aveia Quaker. Coisas que a gente aprende com quem entende e ensina para quem se ama.

Carmélia era atenta. Atenta até que as disfunções da menopausa a tornassem quase uma demente. Na falta de condições para a reposição de hormônios, seus filhos preferiram interná-la no antigo hospital dos doidos. Ali era o lugar certo para quem enfiava a cabeça na geladeira e tomava banho de água gelada em plena noite de junho, inclusive nas em plenilúnio.

Depois dos achaques, Carmélia, todos os dias, antes das seis das matina me procurava e dizia:

- Posso entrar?
- Claro!
- Posso plantar?
- Pode.
- Aqui, nesse canteiro?
- Sim, Carmélia, pode plantar.

Em silêncio, Carmélia plantava pés de macarrão espaguete, enquanto eu regava os canteiros de manjericão e o das alfavacas que teimavam ser maiores que os nanicos da região.

No dia que Carmélia Gardner morreu, por acaso (?), servi no almoço um espaguete à putanesca. Coisa fina, aprendida com os italianos, preparado num panelão que me foi dado pelas minhas comadres lavadeiras da Rua General Severiano. Coisas que a gente aprende com quem entende e convida a quem se ama.

VANDALISMO



Jovem acreano montado na estátua do poeta Juvenal Antunes, em frente ao prédio da Fundação Cultural, no centro histórico de Rio Branco. É neto da professora Íris Célia Cabanelas Zannini, presidente do Conselho Estadual de Educação. A foto está no álbum da página dele, no Orkut.

-
Forte que só ele nééé... UAHHUahHUAHUuhau =P - diz a legenda.

Apliquei tarja atendendo pedido da família dele, que argumentou tratar-se de menor, embora no perfil do mesmo constasse ter 18 anos de idade. O Orkut é uma comunidade de relacionamentos restrita a adultos e seu conteúdo é público, assim como o conteúdo dos blogs. É necessário ter 18 anos ou mais para o usar o serviço. Ao inscrever-se, o usuário afirma e atesta ter 18 anos ou mais e possuir capacidade para compreender, aceitar e cumprir os Termos de Serviço. A família pediu para retirar o título "Vandalismo". Pediu, ainda, para remover a referência ao nome da professora, além do post na qual reproduzi o comentário da tia do jovem. Contradições da vida moderna.

segunda-feira, 26 de fevereiro de 2007

PRISIONEIROS NA ALDEIA

Uma equipe da Fundação Nacional de Saúde foi presa no final desta tarde pelos índios yawanawá, na aldeia Nova Esperança, do Rio Gregório, no município de Tarauacá. Trata-se de um protesto contra o precário atendimento de saáde aos indígenas. Um integrante da equipe, que ficou exaltado e tentou resistir, foi amarrado com cordas pelos yawanawá. Clique aqui para conhecer a tribo.

FERNANDO FRANÇA


Óleo sobre tela 130 x 185 cm (2005).

domingo, 25 de fevereiro de 2007

MAIS GÁS NA POLÊMICA

É inaceitável realizar estudos de prospecção de petróleo e gás em terras indígenas, especialmente naquelas habitadas por povos “isolados”.

Terri Valle de Aquino e Marcelo Piedrafita Iglesias

A notícia a respeito da prospecção de petróleo e gás em território acreano, às vésperas do carnaval 2007, nos pegou a todos de surpresa. Mais espantados ficamos por se tratar de uma iniciativa do senador Tião Viana, considerado um dos herdeiros políticos da luta de Chico Mendes pela preservação da floresta amazônica e por melhores condições de vida para suas comunidades tradicionais. Até por sermos também eleitores do senador, ficamos pasmos.

Desde então, a questão da prospecção de combustíveis fósseis nas florestas acreanas vem sendo debatida na imprensa local e, especialmente, no blog do jornalista Altino Machado. Em entrevistas e matérias divulgadas sobre o assunto, o senador Tião Viana afirma ter aprovado recursos no Orçamento Geral da União (OGU), no valor de R$ 75 milhões, para a Agência Nacional do Petróleo (ANP) licitar e contratar grandes empresas para realizar estudos de prospecção de petróleo e gás no estado sem, no entanto, especificar os locais onde esses estudos serão realizados.

O senador também se diz convicto da existência de grandes quantidades desses combustíveis no Acre, baseado apenas na suposição de que o território acreano encontra-se circundado por áreas produtoras de petróleo e gás existentes no Amazonas e nas regiões vizinhas da Bolívia e do Peru. Sua possível produção no estado, diz novamente o senador, poderá trazer “royalties preciosos aos acreanos”, especialmente aos moradores dos municípios onde forem descobertos tais combustíveis.

Mais uma vez, o blog do Altino levantou a bola para uma boa polêmica, publicando uma nova entrevista com o senador e abrindo espaços para manifestações públicas, entre as quais a do ambientalista Miguel Scarcello (representante da SOS Amazônia), Lindomar Padilha (coordenador do CIMI em Cruzeiro do Sul) e do líder indígena Joaquim Tashkã (presidente da Organização Yawanawá do Rio Gregório).

A polêmica aumentou ainda mais com a pressa e o amadorismo com que a assessoria do senador, em Rio Branco, fez divulgar no site do próprio senador, no blog do Altino e nos jornais locais uma suposta declaração do nosso amigo e compadre Joaquim Tashka Yawanawá, manifestando o “apoio de seu povo ao projeto de prospecções da Agência Nacional de Petróleo em busca de gás e petróleo no Acre”. Esse factóide, no entanto, foi logo desmentido e considerado desrespeitoso pelo líder Yawanawá em carta publicada na íntegra naquele blog.

Terri Valle de Aquino e Marcelo Piedrafita Iglesias são antropólogos. Leia o artigo completo na coluna Papo de Índio, do jornal Página 20.

sexta-feira, 23 de fevereiro de 2007

ZEE

Acre quer área urbana em 0,2% do Estado

Zoneamento territorial vai estimular, por meio de incentivos à zona rural, que espaço ocupado por cidades e entornos se estabilize

O governo do Acre vai incentivar que, por pelo menos quatro anos, as áreas urbanas não ocupem mais de 0,2% da área do Estado — o equivalente a 304 quilômetros quadrados. Esse é um dos efeitos da nova estratégia de ocupação do território acreano, traçada a partir de um mapeamento que busca auxiliar a formulação de políticas públicas.

O levantamento, chamado Zoneamento Ecológico-Econômico, dividiu o Acre em zonas com diferentes perfis, e indicou quais tipos de ações serão ou não incentivadas em cada área, por meio de créditos ou projetos. “Onde está escrito que só se permitem unidades de manejo agroflorestal, aqueles que usam a área para desenvolver atividades agropecuárias não receberão crédito, nem serão contemplados pelo PRONAF [Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar]. Eles podem até usar, mas vão ter que fazer tudo por conta própria”, afirma a gerente de Zoneamento Ecológico-Econômico do Estado, Magali Medeiros.

Reportagem da PrimaPágina. Leia mais no site do PNUD.

VIA VERDE

Quem se preocupar em levantar a cadeia dominial vai ficar abismado com a quantidade de membros do Governo da Floresta que adquiriram extensos imóveis ao longo da Via Verde, antes e durante a sua construção.

Além daquele registrado e de conhecimento público, em nome do secretário Antonio Monteiro, logo após a cabeceira da Terceira Ponte, existem outros, nem todos em nome dos reais proprietários, como aquele em frente ao balneário Por do Sol, que faz fundos com a Casa do Índio, e outros nas imediações do estádio de futebol em construção.

Nos primeiros dias de janeiro o prefeito Raimundo Angelim visitou dois terrenos na Via Verde e escolheu um para a construção da Central de Abastecimento de Produtos Agroflorestais e Extrativistas (Ceasa), na confluência com a Transacreana - o nome de estrada que mais expressa nossa alma.

Quando ficar pronta, talvez no final do ano, a Ceasa será o maior centro atacadista de hortigranjeiros da região, com uma superestrutura de oito hectares, que custará R$ 6,8 milhões, já depositados pela Caixa Econômica, provenientes de emendas parlamentares liberadas pelo senador Tião Viana (PT).

A prefeitura vive agora um dilema porque a cadeia dominial revelou que o terreno pertence a um assessor especial do governo, que, em outro terreno, vai construir um posto de gasolina nas imediações. É torcer para que o prefeito faça a desapropriação pelo valor venal do imóvel.

Mas duvido que tenham a coragem de agir como agiram em relação ao Jorge, aquele motorista de ônibus cuja casa foi demolida por ter se recusado a sair dela pela indenização de R$ 8 mil. Lamentável que membros de um governo petista se beneficiem de informações privilegiadas na administação pública recorrendo aos mesmos expedientes que marcaram as gestões de Paulo Maluf.

Ou, como me disse certa vez o assessor dono do terreno da futura Ceasa:

- Uns nascem para mandar, outros para pastar.

Alguns nascem para fazer as duas coisas, digo.

Plácido de Castro, um dos homens que mais possuiu terras no Acre, não tem mais nem sete palmos aqui.

quinta-feira, 22 de fevereiro de 2007

BRASILTELECOM

A Brasiltelecom não tem jeito mesmo. Permaneci no escritório, de 10h30 às 21 horas, sem conexão com o mundo, mas foi tempo suficiente para forçar a empresa a pagamento de hora-extra para que um técnico solucionasse o problema ao trocar a porta de minha conexão na central telefônica.

A verdade é que o sistema da Brasiltelecom no Acre não suporta a quantidade de usuários que possui, o que tem levado a empresa a estabelecer uma espécie de racionamento ou pedágio. Para driblar o gargalo da incompetência e dos equipamentos obsoletos, diariamente milhares de usuários domésticos são desconectados aleatoriamente da rede.

Além disso, a Brasiltelecom continua sem fazer contingenciamento em decorrência das frequentes interrupções no cabo de fibra ótica, que costumam deixar o Acre incomunicável. Assim, evita gastos com a contratação do satélite da concorrente Embratel e quem fica no prejuízo são os usuários que deixam de usar o serviço cuja tarifa mensal segue elevada e inalterada.

A imprensa não ousa criticar em troca das migalhas da verba publicitária da empresa. Gostaria de ver nossos senadores e deputados empenhados em denunciar a siutação à Anatel e em acabar com o monopólio e o péssimo serviço que tem sido prestado pela operadora.

Mas educação, ciência, tecnologia e informação não são temas que preocupam nossos parlamentares na Ilha da Fantasia. Aliás, alguns não sabem sequer usar o correio eletrônico.

EU MEREÇO

Leila Jalul

Que no meio do caminho há uma pedra e que há uma pedra no meio do caminho, Drummond já disse.


O meu caminho era um pedregulho só. Nas pedras eu topava, escorregava, caia, escangalhava a venta, levantava a poeira e dava a volta por cima. E ia, ia desembestada, com vontade de acertar.

Só nunca gostei de injustiça, mas, por não poucas vezes, fui obrigada a engolir calada um tantão delas. Coisas pequenas, aparentemente. Para criança, coisas pequenas parecem grandes.

Pois é, padre confessa, casa, perdoa, batiza, crisma, se imagina representante de Deus, mas, infelizmente, também vai ao banheiro, comete injustiças, tira partido do poder e outros enganos mais.

Aqui e em outros lugares católicos, o mês de maio era dedicado à Maria, mãe do Nazareno. Mês escolhido para o casamento. Paradoxal, a meu ver. Se Maria era virgem, que razão levou a igreja a eleger o mês para que as mulheres e homens se casassem e, deixando um rastro de sangue nos brancos lençóis, exatamente as mulheres perdessem a virgindade?

No dia 31, era a festa da coroação de Nossa Senhora. Crianças vestidas de anjo, com imensas asas arrematadas com arminhos brancos e coroas de cartolina endurecidas por purpurina prata, desfilavam na procissão e, depois, já na igreja, se ajeitavam numa arquibancada piramidal para o ápice da festa: a coroação.

Nos meses de fevereiro e março, os ensaios. Tinha que estar tudo nos conformes. A coroadora, a ofertora de rosas, a seguradora da coroa e o coro propriamente dito. Tudo dentro da marcação, como no teatro.

Por dois meses fui enganada pelo pároco. Minha voz de contralto, forte, dramática e plena, ecoava do altar-mor e fazia-se ouvida no fundão da igreja, sem qualquer recurso. Só gogó.

Aí que apareceu a pedra. O governador era tio de uma soprano irresistível. E assim, de véspera, fui substituída. De coroadora, baixei para o degrau de ofertora das rosas que nem rosas eram e nem falar falavam.

Tudo pela fé. Não desisti. Embora desconsolada, sabia que Maria era melhor que eu, que o padre e que a “outra”. Fui, mas sem seguir as ordens do ensaio. Ao invés de segurar o ramalhete contra o peito, fiquei com ele levantado. Fui um anjo com porte de estátua da liberdade. Era o meu protesto.

Entreguei as flores e, antes de esperar os aplausos, desci, levei um mochicão do padre-diretor. Fiquei de mal com ele por quase cinqüenta anos. Agora fizemos as pazes e nos comunicamos, como se nada tivesse acontecido.

A soprano sumiu. Maio não tem mais a mesma beleza e, virgem, bem, é coisa rara na praça.

As pedras no caminho insistem.

SEM NADA PRA POSTAR



"Olha que coisa mais linda,
Mais cheia de graça,
É ela menina, que vem e que passa,
Num doce balanço, a caminho do mar".

Clique sobre a imagem.

segunda-feira, 19 de fevereiro de 2007

ÉRICO


Óleo sobre tela 85 x 180 cm (detalhe), do artista plástico acreano Fernando França, que mora em Fortaleza.

PRA DEPOIS DO CARNAVAL


Dica para quem vai velar o Carnaval a partir da Quarta-feira de Cinzas: o Velórios Bar, em Rio Branco (AC), no conjunto Tancredo Neves, contíguo ao cemitério Jardim da Saudade. A foto foi tirada por Fabiano, aluno de jornalismo.

domingo, 18 de fevereiro de 2007

PAU SURDO-MUDO

Leila Jalul

Se alguém conhecer algum primeiranista de qualquer faculdade calado, quieto, tome cuidado. É doente e o mal pega. Ou é esquizofrênico, ou vai ser.

No curso de direito que fiz, eram poucos os caras direitos. A maioria, era porralouca, engraçada, inteligente. Todos desejosos de se firmarem profissionalmente.

No meio deles, o xerife Walter Prado, o desembargador Praça, Isaurinha Maia, Maria Amélia Alencar Araripe Guedes, João Bosco Abdalla Isper, Telmo Camilo Vieira, Carlos Jorge Lavocat, o Galo Tonto, de saudosa memória, Elias Chaul, Antonio José Sapha, Chiquinho do Detran e outros, dentre estes, Conceição.

É de Conceição que vou falar. Antes das aulas, o papo era com Ceiça, como carinhosamente a chamávamos. No banco dos condenados, atentos, ouvíamos a noite de ontem de Ceiça. De segunda até sexta, histórias novas. Era doida aquela mulher.

A TV chegou ao Acre só em 74. Foi naquele ano que um belo jovem fazia as vezes do Willian Bonner da TV Acre, afiliada da Globo. Pensem num homem lindo. Multipliquem por três e os leitores terão idéia do nosso Bonner. Lindodó.

Um dia, cheguei mais cedo, só para ouvir as doidices da Ceiça, que marcou namoro com o lindodó.

- E aí, Ceiça, conseguiu?

- Consegui.

- E aí?

- Uma merda!

- Como? Uma merda, como?

- Mulher, nem te conto. Fomos no fusca dele para a estrada da Cruz Milagrosa. Ficamos parados bem na frente da cruz...

- Sim. E daí?

- Daí? O cara ficou mais de duas horas para me dizer que o negócio dele só subia se eu conversasse com ele...

- E pau ouve, Ceiça?

- Ouve nada. Fiquei com aquele troço morto na minha mão, enquando dizia: "querido, pensa, aqui quem fala é tua dona. Olha, sou a Ceiça, tenha fé que tudo vai dar certo".

- E deu?

- Deu nada. Quanto mais eu falava, mais aquele troço esfriava. Parecia maria-mole. Beijo de gia, sabe como é? Alisei, esfreguei, falei ao pé do ouvido e nada.

- E aí?

Aí começou a aula do doutor Ilmar Galvão. Nada mais foi dito, nada mais foi perguntado, nada mais foi respondido. Desse dia em diante comecei a duvidar dos milagres da cruz milagrosa.

sábado, 17 de fevereiro de 2007

TASHKA ESCLARECE

Líder indígena contesta versão da assessoria do senador Tião Viana de que a etnia yawanawá já apóia os estudos de prospecção de gás e petróleo na área indígena do Rio Gregório



Joaquim Tashka Yawanawá

O título "Tashka apóia prospecção" é desrespeitoso. Melhor seria "Tashka atende convite do senador e vai consultar seu povo sobre prospecção na terra indígena do Rio Gregório". Vejo precipitação de Flaviano Schneider, da assessoria de imprensa do senador Tião Viana, ao distribuir a inverdade de que o povo yawanawa já apóia os estudos de prospecção de gás e petróleo no Juruá.

Para tomar uma decisão dessa, temos que fazer profunda reflexão com a participação da comunidade, pesquisar a experiência de outros povos indígenas e visitar os que tiveram experiências positivas e negativas com a exploração do petróleo, a exemplo do povo U´wa, da Colombia, e Achuar, do Equador.

Nunca decido isoladamente, pois não sou George Bush, que age assim e faz a sua própria guerra.

Fui convidado a comparecer na manhã de ontem ao escritório do senador Tião Viana, juntamente com minha esposa Laura e minha irmã Raimunda Putani. Fomos conversar com a Sílvia, uma das assessoras do senador, que acompanha nosso projeto de criação de pequenos animais.

Conversamos com a Sílvia na sala onde também trabalha Flaviano Schneider. Após a conversa, encontramos o senador, que nos convidou para entrar em sua sala. Aceitamos apenas para cumprimentá-lo e agradecê-lo pelo apoio que tem prestado ao povo yawanawá, especialmente com o envio da equipe da Saúde Itinerante.

O senador nos recebeu, como sempre, com carinho e atenção. Após nos ouvir, falou empolgado do projeto de prospeção de gás natural aqui no Acre. Falei que estava acompanhando o debate aberto pelo blog do jornalista Altino Machado e que havia assistido ao vídeo da entrevista dele.

Falei que tinha gostado do trecho no qual ele deixa bem claro que as comunidades tradicionais não serão obrigadas a permitir a prospecção em suas áreas. Tião Viana nos perguntou se tínhamos interesse em participar. Respondi que viajarei para minha aldeia após o Carnaval e que iria debater o tema com a comunidade. E que voltaria a falar com ele, tendo o senador nos deixado a vontade na opção.

O senador Tião Viana e o irmão dele, o ex-governador Jorge Viana, têm grande afinidade com o povo yawanawa. Nós temos estima, consideração e respeito por ambos, pois são parceiros e apoiadores do nosso povo. Já estiveram várias vezes na comunidade e por isso conquistaram nosso respeito e amizade.

Após sair do gabinete, telefonei para o Biraci Nixiwaka, outra liderança yawanawá, a quem relatei sobre a nossa reunião com o senador. Nixiwaka disse não acreditar que a iniciativa do senador fosse nos trazer danos socioambientais em razão da seriedade com que tem tratado nosso povo e a questão indígena no âmbito nacional e regional.

Antes desse debate sobre prospecção, o povo yawanawá já estava na fase inicial de um projeto de biodiesel. Ele está sendo apoiado por várias organizações nacionais e internacionais. Queremos produzir o biodiesel a partir do cocão e do murmuru, nativos de nossa terra indígena, em parceria com todas as comunidades que habitam a região de Tarauacá e Feijó.

Além disso, estamos implantando um usina de biodiesel na cidade de Tarauacá, onde já funciona a usina de processamento de óleo de andiroba. Queremos viabilizar de forma sustentável nossos recursos naturais, sem causar danos ao meio ambiente e viabilizar social e economicamente nosssas comunidades.

Atualmente, estamos pesquisando a respeito das máquinas que serão usadas no beneficiamento. Encontramos uma, de médio porte, que produz dois mil litros de biodisel por dia usando produtos naturais. Nosso objetivo é ter um posto indígena de biodisel, que produza totalmente com a matéria-prima existente na região. Isso não significa que estamos fechados para outras possibilidades.

Não acredito que estejamos sobre uma Arábia saudita ou poços de gás natural.
Caso seja encontrado algum recurso natural que possa ser explorado, seremos obrigados a fazer uma grande reflexão sobre se existe a real necessidade de explorá-lo, pois teremos que ter noção dos impactos e que ganhos reais poderíamos ter sem que seja afetada a nossa cultura e o meio ambiente.

Enquanto estive no gabinete do senador, não declarei que todos nós temos um preço. Não somos obrigados a aceitar nenhuma proposta arbitrária que possa contrariar a nossa tradição e afetar o nosso meio ambiente. Em nenhum momento o povo yawanawá vai aceitar explorar seus recursos naturais visando apenas o lucro econômico. Nosso patrimônio natural não está a venda por dinheiro nenhum, não estamos loucos por dinheiro. O pouco que temos através de nossas parcerias tem sido suficiente para sustentar nosso povo.

Mas nós entendemos que poderemos explorar nossos recursos naturais na medida que essa exploração não signifique danos às pessoas e ao meio ambiente e que sejam assegurados benefícios reais para nosso povo.

Nasci ambientalista. Não frequento a academia, tampouco cultivo árvores ou jardins no quintal apenas para dizer que sou ambientalista. Não há quem possa discutir comigo sobre o quanto a floresta é mais importante para o povo indígena. Nós somos 100% dependentes da floresta para viver.

O que está exposto é uma questão polêmica. Assim como o senador, acho que mais pessoas devem se manifestar. Não é de meu interesse defender nenhum projeto que não conheça profundamente e não aceito ser desrespeitado. O respeito deve ser extensivo à soberania de meu povo e à memória de nossos ancestrais, sem ameaças ao futuro de nossas gerações.

sexta-feira, 16 de fevereiro de 2007

FELIPE MILANEZ



Caro Altino,

seguem mais fotos da operação. O rio é o Envira, já lá em cima, na fronteira. A serra mostra a dificuldade de acesso à região, onde começa os Andes. A pequena casa é a maloca num roçado pertencente a um grupo indígena isolado, isto é, sem contato com a sociedade nacional. A outra é a imagem de uma coordenada de GPS dessa aventura em terras acreanas.

Um abraço

Felipe Milanez



TASHKA APÓIA PROSPECÇÃO

Flaviano Schneider, da assessoria de imprensa do senador Tião Viana, pede a publicação da notícia a seguir, segundo a qual o povo yawanawa é a favor da prospecção de gás e petróleo no Acre. Leia:

O coordenador da nação yawanawa, Joaquim Tashka, depois de consultar por telefone os demais líderes, garantiu apoio do seu povo ao projeto de prospecções da Agência Nacional do Petróleo em busca de gás e petróleo no Acre.

- Queremos participar. Estamos abertos às prospecções - afirmou Tashka, após visitar o senador Tião Viana em seu escritório em Rio Branco, acompanhado da esposa Laura Soriano e da pajé Raimunda Putani.

Segundo o líder indígena, um povo indígena só pode cultivar sua herança cultural se for unido e só pode ser unido se tiver um projeto econômico. Ele disse que a venda da produção do corante de urucum para a indústria européia ajudou a consolidar seu povo economicamente, o que abriu caminho para a reorganização cultural.

Tashka Yawanawá disse que os royalties de uma possível exploração, desde que ocorra sem danos ambientais, são bem vindos, pois garantirão ainda mais a independência econômica de seu povo.

- Tudo que o homem faz tem um preço. Se eu fizer uma casa na aldeia, terei que cortar uma árvore.

Para ele, não é justo que os países vizinhos explorem gás e petróleo e nós não possamos fazê-lo. No caso do Acre, se pudesse substituir o óleo diesel consumido por gás produzido aqui mesmo, o impacto ao meio ambiente seria consideravelmente menor.

Tashka entende que os recursos dos royalties podem ser utilizados para a proteção e o estudo da floresta e a preservação perene. Para ele, a soja seria bem pior, pois implicaria em desmatamentos.

- Estamos com toda a riqueza. Temos a floresta, a biodiversidade, a diversidade cultural. Talvez estejamos também em cima da riqueza. Mas somos pobres. É isto que precisa acabar. O petróleo e o gás, podem mudar isto.

ÍNDIOS ISOLADOS DO ACRE

Funai encontra aldeias e acampamentos
de índios sem contato no Estado



No domingo, na casa do Tashka Yawanawá e da Laura Soriano, almocei peixe moqueado na companhia do antropólogo Terri Aquino e dos jornalistas Antonio Alves e Felipe Milanez, editor da revista Brasil Indígena, da Funai. Felipe viajou no dia seguinte e é dele a mensagem enviada nesta manhã:

"Caro Altino, como vai?

Estou em Feijó, indo para Tarauacá para visitar a aldeia do Bira. Ontem foi realizado o sobrevoo do Ibama, Funai e Polícia Federal. Te mando dois relatos que escrevi para o site da Funai. No mesmo site da Funai tem os links para a revista Brasil Indigena.

No próximo e-mail te mando algumas fotos da operação. O filme, no entanto, não consegui baixar no computador e só vou poder fazer isso quando retornar a Brasilia. Mas, enfim, a operação foi muito boa, sobrevoamos o paralelo 10 até a altura do posto do Xinane, e, por cima, não foi encontrado vestigios de invasão de madeireiros.

A ideia do Ibama e da Funai, especialmente no âmbito local, do Antonio Lima (Careca), chefe do Ibama aqui em Feijó, e do José Carlos dos Reis Meirelles, chefe do posto da Funai, é criar uma estrutura de logística que permita que sempre que o helicóptero do Ibama estiver por aqui, seja possível fazer um sobrevoo de monitoramento da área. Isso significa a cada dois meses, ou mesmo uma vez por mês.

A ideia é uma ação preventiva - já que se sabe que, do lado de lá, há ação de madeireiros. Quando chegar a Rio Branco, provavelmente no final da semana que vem, te ligo para a gente conversar.

Um abraço

Felipe Milanez

Durante sobrevôo de fiscalização da região amazônica na fronteira com o Peru, no norte do estado do Acre, em operação conjunta entre a Funai, o Ibama e a Polícia Federal, na quinta-feira 15, foram vistas algumas aldeias, roças e acampamentos de caça de grupos indígenas autônomos. Possivelmente pertencente ao grupo lingüístico pano, em razão dos itens plantados em sua agricultura, os pontos geográficos são mantidos em sigilo para impedir ameaças aos índios.

- Tratando-se de índios isolados, nunca podemos afirmar quem eles são. Temos alguns indicativos. Mas o importante não é saber quem são eles, a qual grupo pertencem, e sim protege-los, garantir o seu território e deixar que vivam do jeito que quiserem, como nações autônomas - disse o sertanista José Carlos dos Reis Meirelles Júnior, chefe da Frente de Proteção Etnoambiental Envira, da Funai.

A área possui mata intacta, e não foi ocupada durante o período da seringa na região. Como é uma área de difícil acesso, foi possível que os índios sobrevivessem às “correrias”, como eram chamadas as caçadas aos índios que ocorreram até os anos 1970. No entanto, com a recente exploração madeireira no lado peruano, tem tido início um deslocamento forçado de grupos indígenas autônomos pela região, o que pode gerar conflitos com grupos indígenas contatados que vivem no Brasil, assim como entre os próprios índios autônomos.


- Temos notado um aumento da concentração de índios isolados nas cabeceiras do Envira. Tem alguns grupos nômades que sempre passavam por aqui, a cada dois, três anos, mas a gente tem percebido que eles estão voltando cada vez mais rápido, e indo cada vez mais longe no território de outros grupos indígenas - afirma Meirelles.

A aldeia que foi sobrevoada pode ser pano, da família Jaminawa. De acordo com Meirelles, há menos de dez anos foi contatado um grupo Jaminawa, no lado peruano, por missionários americanos. Os Jaminawa foi um dos últimos grupos a ser contatado no Acre, a ter sido caçado e encurralado nas “correrias”. Ao lado da cidade de Feijó, às margens do rio Envira, há uma aldeia Shanenawa. Nela vive uma senhora chamada Maria, que foi capturada, nos anos 1950, numa expedição de caça chefiada por um conhecido caçador de índios da região, Pedro Biló. A ela foi arrumado um marido na aldeia, Antonio Alves, e mesmo algum tempo depois, ela continuava a encontrar seus parentes, ainda autônomos, nas matas da região. Falava a língua da família pano, e pelo corte de cabelo e hábitos, pode pertencer a uma comunidade do grupo Jaminawa.

- Já avistamos índios pelados, com o cabelo raspado dos lados, bem ao estilo Jaminawa. Eu não me surpreenderia se um dos grupos isolados da região fosse Jaminawa. Mas não podemos afirmar nada, insisto, com certeza, em se tratando de índios isolados - pondera Meirelles.

Segundo o sertanista, há pelo menos três grupos indígenas diferentes na área. O temor das autoridades, nesse caso, é que o aumento da concentração de índios isolados causado pelo avanço dos madeireiros peruanos pode dar início a um conflito entre eles.

- Esses índios usam de um território grande para viver, com longos deslocamentos, mudanças de aldeias e locais de caça. Se forem obrigados a viverem muito próximos um dos outros, há uma ameaça. Nosso trabalho é proteger a terra deles de invasão, e deixar para que eles se entendam da forma que sempre se entenderam, sem a interferência externa - conclui.

Clique aqui para ler post de 2004 sobre o ataque dos índios isolados ao sertanista José Carlos dos Reis Meirelles Júnior.

FISCALIZAÇÃO

Ação conjunta da Funai, Ibama e PF
faz monitoramento da fronteira com o Peru

Felipe Milanez

Foi realizada ontem uma ação de monitoramento da fronteira entre o Brasil e o Peru, na região norte do estado do Acre, ao longo do Paralelo 10, reunindo representantes da Funai (Fundação Nacional do Índio), do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis) e da Polícia Federal.

O objetivo da missão era fiscalizar a possível entrada de madeireiros peruanos em território nacional, que além de ameaçar as riquezas naturais da região, tais como o mogno, tem causado a migração forçada de grupos indígenas autônomos que vivem nessa parte da Amazônia e que podem dar início a conflitos com os povos indígenas contatados e moradores ribeirinhos ao longo dos rios Envira, Gregório, Tarauacá e seus igarapés afluentes.

O sobrevôo em helicóptero do Ibama por cerca de cinco horas partiu de Feijó, foi para Cruzeiro do Sul, acompanhou toda a linha de fronteira seca marcada pelo Paralelo 10, até o posto de fiscalização da Funai Xinane, localizado às margens do rio Envira, retornando sobre o rio Envira até a cidade de Feijó.

A região é de difícil acesso, bastante sinuosa, com morros que anunciam o início da cordilheira dos Andes. No início do ano passado havia sido denunciado por José Carlos dos Reis Meirelles Júnior, chefe da Frente de Proteção Etnoambiental Envira, a ação de madeireiros peruanos nas nascentes do rio.

No período das cheias, desciam pelas águas troncos e pranchas cortadas de mogno, assim como caixas de óleo para moto-serra e outros materiais peruanos, o que indica a ação de madeireiros nos formadores do rio. Após algumas expedições feitas pela equipe do posto de vigilância em terra, o sobrevôo visava confirmar se a ação estava se dando em território nacional ou além da fronteira.

- Temos escutado tiros e barulhos de moto-serra cada vez mais perto, e essa é uma região isolada, o que não deveria acontecer. Felizmente, ao menos aparentemente os madeireiros ainda não chegaram ao Brasil. Mas o que eles estão fazendo do outro lado de lá da fronteira vai ter impacto aqui, tanto ambiental como socio-etnológico, colocando em conflito os grupos indígenas autônomos que habitam essa área - afirmou o sertanista Meirelles.

De acordo com o superintendente do Ibama no Acre, Anselmo Alfredo Forneck, não há como controlar a ganância dos que estão do lado de lá, mas é preciso proteger a riqueza natural e etnológica brasileira, garantindo a autonomia e a liberdade dos índios.

- É uma ação continuada. Ao longo do ano passado temos monitorado a fronteira norte do Acre, e será dada continuidade a esse trabalho por esse ano e no próximo, com sobrevôos contínuos para verificar a degradação e as invasões na área.

Segundo o chefe da Coordenação Geral de Índios Isolados da Funai, Marcelo dos Santos, o sobrevôo é uma ferramenta importante, mas não a única de trabalho, pois não se sabe do alto o que está acontecendo por baixo das árvores, dentro da floresta.

- Mas os dados empíricos que temos é que a concentração de índios está aumentando do lado brasileiro, o que pode significar que eles estejam sofrendo ameaças do outro lado da fronteira - afirma Santos.

MIGUEL SCARCELLO

Prezado Senador Tião Viana

Assisti ao vídeo de sua entrevista ao blog do jornalista Altino Machado, onde o Sr. manifesta seu posicionamento e conhecimento a respeito da exploração e utilização do gás e a respeito da atuação das ongs ambientalistas, em particular da SOS Amazônia, e por último, sobre o seu compromisso com o Parque Nacional da Serra do Divisor.

Quanto a exploração do gás, concordo com as suas preocupações, e creio que os órgãos ambientais tenham competência suficiente para licenciar todos os processos referentes a esta questão, e que, com certeza, espero, irão resguardar o meio ambiente dos possíveis impactos que tal empreendimento pode causar.

A respeito da utilização do gás, considerado por Vossa Excelência como matéria-prima para energia limpa, discordo da sua afirmativa, pois o gás é um combustível de origem fóssil e que apenas polui um pouco menos do que a gasolina e o diesel. A respeito das ongs’s ambientalistas, percebi que suas considerações são um tanto preconceituosas e que discriminam o terceiro setor. Sem dúvida as entidades do terceiro setor passaram a ser mais atuantes e a acessar maior volume de recursos para que trabalhem.

Boa parte os recursos vêm de doações e concorrências públicas, todas tendo como base a apresentação de um projeto, que tenha claro seus objetivos, metas e um orçamento apontando onde estes serão gastos. As que não fizerem corretamente e não atingirem o que ficou compromissado são cobradas e passam a ter mais dificuldades para conseguir novos apoios. Infelizmente, como em todos os espaços onde o homem atua, em algumas ongs problemas acontecem. O mais negativo é que boa parte destes casos passam a ser referência sobre o terceiro setor e pouco se enfatiza o quanto as ongs ambientalistas que trabalham na área ambiental contribuem para conservação e para evitar que problemas mais graves aconteçam ao meio ambiente.

Sobre o acesso a recursos pela SOS Amazônia, queremos informar que seguimos todas as exigências estabelecidas pelos doadores e instituições para se acessar os recursos. No caso do montante de R$ 600 mil que Vossa Excelência informa, para que elaboremos o plano de manejo do Parque Estadual do Chandless, quero deixar claro que vencemos uma concorrência com empresas privadas, com orçamento três vezes maior do que o que propomos, e como em qualquer projeto, iremos atender todas as exigências estabelecidas em contrato. Cabe informar também que o recurso é originário do Programa Áreas Protegidas da Amazônia (ARPA) e que se trata de uma iniciativa da ong ambientalista WWF, juntamente com o Banco Mundial e o KFW (agencia alemã de cooperação) e com o Ministério do Meio Ambiente, que conseguiram captar dinheiro doado, visando apoiar unidades de conservação na Amazônia.

Sendo assim, o recurso que captamos tem uma finalidade e neste caso não se destina ao Parque Nacional da Serra do Divisor. Ao cobrar de Vossa Excelência que coloque no orçamento da União emenda para o funcionamento do parque, faço isso como uma cobrança natural de qualquer cidadão ou instituição, pois consideramos sua obrigação, já que se trata de um Parque Nacional, que é responsabilidade do governo federal, especificamente do Ibama, e que precisa necessariamente destes recursos para funcionar. Principalmente porque o Ministério do Meio Ambiente possui um dos menores orçamentos e o Ibama anda sempre sem recursos e só funciona para fiscalizar as florestas já derrubadas. Desta forma, não nos sentimos na obrigação e nem somos irresponsáveis de utilizar recursos de um projeto destinado ao Parque do Chandless (por sinal os recursos ainda sequer foram repassados) na Serra do Divisor.

Como temos falhado na nossa comunicação sobre o que fazemos, aproveito para informar que durante os 12 anos que atuamos no Parque da Serra do Divisor, recebemos para tal um total de aproximadamente U$ 2,5 milhões, menos de U$ 3.00 por hectare. Os recursos foram recebidos para vários fins, dos quais destacamos:

1 – Elaboração do Plano de Manejo do Parque, concluído em 1998, validado em 2002 – cabe destacar que neste documento encontram-se os resultados da primeira avaliação ecológica rápida realizada no Acre e a base cartográfica gerada, na escala de 1:250.000 do Vale do Juruá, com vários temas, serviu como base para o Zoneamento Ecológico Econômico do Acre;

2 – Cadastramento das famílias residentes no Parque, de 1999-2001;

3 – Estudos para regularização fundiária, iniciados em 2002;
4 – Criação do Conselho Consultivo do Parque Nacional, em 2002;

5 – Viabilização e participação do Plano de Uso Público (plano de ecoturismo do Juruá) do Parque Nacional, elaborado em 2002;

6 – Apoio e acompanhamento dos estudos para identificação dos índios Nawas – 2000;

7 – Criação do primeiro Projeto de Assentamento Florestal no Brasil, PAF Havai em Rodrigues Alves, para assentar familias interessadas em sair do Parque – 2002 a 2004;

8 – Articulação e mobilização para inserção do Parque Nacional, no Programa ARPA;

9 – Articulação e mobilização para Inserção do Parque Nacional, no PROECOTUR;

10 – Mapeamento da evolução do desmatamento no Parque e no Vale do Juruá – 2005;

11 – Plano de Monitoramento de alvos para Conservação, em 2002;

12 – Monitoramento de espécies ameaçadas, a partir de 2003, inclusive a Resex do Alto Juruá;

13 – Apoio a criação de tracajás, na TI Kampa do Rio Amônia, 2003;

14 – Participação, coordenação e apoio a criação e funcionamento do Grupo de Trabalho para conservação da biodiversidade trans-fronteiriça – Acre/Ucayali, 2005 e 2006;

15 – Participação, articulação e apoio a instalação do Fórum de Integração Acre- Ucayali, 2005/2006;

16 – Produção de materiais de divulgação sobre o Parque Nacional e criação da logomarca e de site sobre o Parque, em 2002;

17 – Articulação e mobilização para inserção do Parque Nacional no Programa BID;

18 – Indicação e apoio a execução de Projeto pela EMBRAPA e o PESACRE, com apoio do PRODETAB, que deu origem o Projeto de Desenvolvimento Sustentável São Salvador, em Mâncio Lima, em 1999;

É bom informarmos que todos os recursos foram doações feitas por instituições internacionais, como a USAID, The Nature Consevancy, Fundação Alton Jones, Fundação Gordom Moore, e nacionais, como a Fundação O Boticário. Em momento algum, durante este período, recebemos qualquer recurso do Ibama, ou do Governo Federal para trabalharmos juntos, muito pelo contrário, em algumas ocasiões apoiamos algumas iniciativas dos seus técnicos, sem nenhum compromisso contratual e muitas vezes, através da nossa pressão em Brasília, conseguimos que o Ibama destinasse recursos para que a superintendência no Acre pudesse nos acompanhar ou viabilizar o trabalho de parceiros como o Incra, no caso ao se fazer o levantamento para a regularização fundiária do Parque em 2002. Ressalto também que tudo o que fizemos tem sido feito junto com o IBAMA, com a sua participação e autorização.

Como o Senhor pode constatar, infelizmente não pudemos empreender nada relacionado a implementação do ecoturismo dentro do Parque Nacional. Não faltou vontade, porém sempre fomos impedidos legalmente de fazê-lo, pois, caso o Senhor não saiba, num parque ou em unidades de conservação da União, qualquer iniciativa dentro dele, mesmo que seja um “tapiri” como o Senhor sugere, é preciso que o órgão público participe e autorize. Em particular, na Serra do Divisor, que tem um Plano de Uso Público já aprovado em 2002 e lançado pela inistra Marina Silv,a em 2004, qualquer iniciativa precisa seguir as prioridades estabelecidas pelo Iibama.

Infelizmente, devido a falta de recursos, a série de dificuldades que o órgão passa, e o desinteresse do Ibama em manter a parceria que tínhamos até 2002, nada foi feito até hoje para o ecoturismo. Este é o motivo da nossa cobrança e da nossa sugestão, já que tanto o parque quanto o Ibama, são duas instituições do Governo Federal que obrigatoriamente devem receber recursos da União para funcionarem e, creio eu, dos parlamentares que se anunciam comprometidos com as questões socioambientais, uma parte dos recursos a que tem direito com as suas emendas parlamentares. Aproveito para lembrar aqui a iniciativa do então senador Julio Eduardo (PV), que em 2001 ou 2002, destinou aproximadamente R$ 250 mil para se desenvolver uma série de materiais que hoje são utilizados para se divulgar o parque.

Sempre ao seu dispor para quaisquer esclarecimentos,

Atenciosamente,

Miguel Scarcello

ACRE NO ESTADÃO

Parque no Acre é alvo de corrida ao petróleo

João Maurício da Rosa


O Parque Nacional da Serra do Divisor, na fronteira do Acre com o Peru, um dos locais mais biodiversos da Amazônia brasileira, está no centro de uma nova corrida ao petróleo. Ele receberá uma investida para exploração do recurso nos próximos anos, a partir da abertura de licitação de R$ 27 milhões para a contratação de uma empresa de prospecção pela Agência Nacional de Petróleo (ANP).

A notícia foi dada pelo senador acreano Tião Viana (PT) depois de encontro, na segunda-feira, com o diretor-geral da ANP, Haroldo Lima. O senador nega que haja intenção de exploração dentro do parque. 'Tudo será feito onde o status legal permitir e com a consideração plena que o risco de dano ambiental será zero.'

Esta não é a primeira vez que o Vale do Juruá, onde fica o parque, é alvo desse tipo de atividade: houve duas tentativas frustradas nas décadas de 1930 e 1970. Uma de suas principais atrações é, ironicamente, um gêiser localizado pela Petrobrás quando perfurava o solo em busca de petróleo.

A ANP alega que o Estado está na vizinhança de uma região peruana onde são produzidos 110 mil barris de óleo por dia extraído por 13 empresas - entre elas a Petrobrás. Também confirma que tem planos de estudos no Estado, mas afirma que a pesquisa só acontecerá com a permissão do Ibama. A bacia não foi incluída no próximo leilão de energia.

O Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza veta a exploração em parques nacionais. O fato é citado como critério de exclusão em uma apresentação sobre gestão ambiental disponível no site da própria ANP.

Esperança
O Acre sobrevive de repasses do governo federal. Uma eventual descoberta de petróleo representaria a redenção econômica do Estado, e já causa euforia no meio empresarial.

O presidente da Federação do Comércio, Leandro Domingos, acredita que só a prospecção geraria emprego e aqueceria os negócios no Acre, mesmo que nenhum poço seja encontrado. O mesmo diz o presidente da Federação das Indústrias local, João Salomão. Para ele, a prospecção cria negócios no setor de serviços e de aluguéis de máquinas e veículos.

O geógrafo Miguel Scarcello, presidente da SOS Amazônia, ONG que elaborou os planos de manejo, em 1998, e de uso público do parque, em 2002, se diz surpreso. O Acre tem investido num 'governo da floresta', que busca investimentos com impactos ambientais reduzidos.

Scarcello defende que o parque tem vocação para o ecoturismo. Embora fique numa área isolada do Brasil, acessível apenas por barco ou avião, o local recebe visitantes do mundo todo.

quinta-feira, 15 de fevereiro de 2007

TIÃO VIANA - ENTREVISTA

"É preciso colocar verdades na frente do diálogo e
a autoridade maior é das populações tradicionais"




O senador Tião Viana (PT) é autor de uma emenda de R$ 75 milhões ao Orçamento Geral da União para que a Agência Nacional do Petróleo (ANP) desenvolva estudos de prospecção de gás e petróleo na fronteira com a Bolívia e o Peru.

O maior erro dele até agora foi o de ter anunciado o esforço baseado apenas na abordagem dos dividendos econômicos, sem ter mencionado qualquer preocupação com as questões ambientais numa região marcada pela alta concentração de biodiversidade, mananciais, índios isolados, populações tradicionais e áreas de preservação.

Tião Viana reconhece que cometeu um erro de comunicação e assegura que já havia dialogado com a direção da ANP para garantir a participação dos órgãos ambientais nos estudos de prospecção, o que, segundo afirmou, deverá ocorrer a partir de março.

Ele disse que continua comprometido com as causas ambientais e citou como prova mais recente o projeto apresentado durante a semana no qual propõe a adoção de critérios ambientais em todo e qualquer tipo de licitação que seja realizada no poder público.

- Cerca de 30% do Produto Interno Bruto do Brasil são hoje transferidos para compras governamentais, tanto no âmbito da União quanto dos estados e dos municípios - assinalou.

O senador acredita que seu projeto poderá significar uma enorme contribuição à preservação do meio ambiente brasileiro, principalmente da biodiversidade amazônica, considerada a maior e mais rica do planeta.

De acordo com o projeto, uma empresa de celulose que não realiza o manejo florestal sustentável ficará proibida de vender produtos a órgãos públicos. Ele quer que as empresas sejam obrigadas a adotar critérios de sustentabilidade ambiental caso queiram participar das licitações públicas.

Mas foi basicamente a respeito de meio ambiente, índios e a possibilidade de petróleo e gás no Acre que conversei hoje com o senador, no seu gabinete calorento de Rio Branco.

- Os índios têm que entender o seguinte: há ou não dano ambiental com a exploração de gás? Se for dito que não há, eles têm que ficar tranquilos, pois lá no Espírito Santo, onde estava a polêmica, já foi liberado pelos órgãos de meio ambiente e não haverá danos aos corais, não haverá danos ao mar. É preciso colocar verdades na frente do diálogo e a autoridade maior é das populações tradicionais. Se um povo indígena disser que naõ quer exploração em sua reserva, então não se explora. Mas as populações podem também, com royalties, permitir a exploração sem danos ao meio ambiente. Com isso, nós poderemos salvar toda essa comunidade, não deixar derrubar ou queimar mais uma árvore. Isso é muito melhor do que a gente ficar com fome, sofrendo, e as árvores sendo derrubadas e queimadas por alguns inescrupulosos - afirmou o senador.

A empolgação de Tião Viana quase não me permitiu fazer perguntas durante a entrevista. Vale a pena acompanhar esse debate negligenciado pela imprensa oficial acreana. Assista ao vídeo.

NA SALA DO SENADOR

Voltei agora do gabinete do senador Tião Viana. Ao chegar, lá estava o jornalista Luis Carlos Moreira Jorge, colunista da Gazeta. Foi atendido pelo senador numa conversa que durou uns 30 minutos. Entrei para fazer a entrevista e a nossa conversa demorou mais de uma hora. Ao sair, encontrei na sala de espera o empresário Ely Assem de Carvalho, proprietário do jornal A Tribuna. Bem, vou providenciar o vídeo da entrevista com o senador. Inté.

REPERCUSSÃO

Senador Tião Viana (PT) telefona para dizer que considera "muito positiva" a iniciativa do blog de abrir espaço para o debate sobre a emenda parlamentar de autoria dele, que garante R$ 75 milhões no Orçamento Geral da União para que a Agencia Nacional do Petróleo faça prospecção de petróleo e gás em nosso território.

- O debate é necessário e espero que mais pessoas se manifestem - disse o senador, com quem terei um encontro mais tarde, na esperança de que possa conceder entrevista a este modesto blog.

Aproveito para destacar os comentários da professora e historiadora Fátima Almeida e do indigenista Lindomar Padilha, da coordenação do Conselho Indigenista Missionário em Cruzeiro do Sul. Os comentários se referem ao artigo de autoria do ambientalista e secretário da SOS Amazônia, Miguel Scarcello:

Fátima Almeida: "Admiro Miguel pela coragem, pela coerência. Esse texto escrito por ele é um documento muito importante para nossa história e deveria ser transformado em manifesto. Muitos de nós assinou o documento redigido por Juca de Oliveira, precisamos agora apoiar Miguel. Muitos de nós aqui em Rio Branco, com capacidade para formar opinião, temem debater com os políticos que decidem a ocupação dos cargos e mais parecem o jacaré daquela estorinha amazônica: quando a onça esturra ele se arreia todo na praia, deixa ela vir comer o rabo dele e ir embora".

Lindomar Padilha: "Para além de possíveis divergências com o Miguel e SOS Amazônia, concordo fundamentalmente com o artigo. Como não bastassem os devaneios de uma ligação rodoviária com o 'Pacífico' aqui no Juruá, querem insistir com o petróleo e gás, justamente quando a humanidade começa a entender que esse é o pior caminho. Os Estados Unidos, maior poluidor universal, vem em busca de energia mais limpa. Nós não podemos aceitar que o Brasil e, especialmente o Acre da 'florestania', mergulhe na idéia do desenvolvimento a qualquer custo. Já basta a privatização de florestas públicas que, se Deus quizer, ainda vamos derrubar. A campanha da fraternidade da CNBB nos convida a uma reflexão sobre a realidade da Amazônia. O momento é de somarmos forças em um mutirão pela amazônia e seus habitantes. Resolvi acrescentar mais um comentário que serve mais como uma observação ou cobrança. É que os moradores não-índios do Parque Nacional ainda não receberam nenhum tipo de indenização. A demarcação da terra dos Nawa ainda não se consolidou e a revisão da terra dos Nukini também está parada. Não há dinheiro para realizar essas obrigações do Estado brasileiro. Não há dinheiro para fazer funcionar o parque e desenvolver ações permanentes de fiscalização. Mas há dinheiro para a prospecção de petróleo e gás. E, assim, vamos dormindo em paz.

FOTO DO UIRAPURU



Gloria Perez repassa a mensagem que recebeu de nosso amigo Dalgas Frisch, aquele que fez o primeiro registro sonoro do canto do uirapuru nas matas do seringal Bagaço, em Rio Branco, em novembro de 1962:

- Finalmente consegui a imagem do Uirapuru verdadeiro (Cyphorhinus modulator) que me fora solicitada pelo sr. Douglas, da TV Globo. Naquela ocasião, enviei um desenho, provisoriamente. Espero que esta imagem sirva para os trabalhos da minissérie Amazônia.

Dalgas Frish e Glória Perez estão em campanha para que o uirapuru verdadeiro seja adotado oficialmente como ave símbolo do Acre. Vale um clique sobre a imagem do pássaro cuja ocorrência se limita ao Acre e suas fronteiras com o Peru e a Bolívia.

quarta-feira, 14 de fevereiro de 2007

VELHA CALDEIRA



Restos da caldeira abandonada desde 1934 no Parque Nacional da Serra do Divisor, durante a primeira prospecção de petróleo na região do Vale do Juruá.

Tentarei uma entrevista com o senador Tião Viana sobre a promessa de prospecção de petróleo e a preocupação dos ambientalistas com os recursos naturais de uma das áreas com maior biodiversidade do planeta. A foto é de Sérgio Vale.

AO SENADOR TIÃO VIANA

Prospecção de petróleo e gás no Acre

Miguel Scarcello

A noticia veiculada na imprensa é muito importante para o nosso Estado: o senador Tião Viana (PT) garante emenda parlamentar de R$ 75 milhões para que a Agencia Nacional do Petróleo (ANP) faça prospecção de petróleo e gás no nosso território, na perspectiva de que a tecnologia existente possibilite que o potencial já mensurado na região do Juruá seja considerado uma jazida e com isso possa gerar royalties para o Acre a partir da exploração.

Diante do fato, quero fazer alguns comentários a respeito da região que será palco da prospecção, o Vale do Juruá, com grandes possibilidades de ser no Parque Nacional da Serra do Divisor (PNSD), do volume de recursos a ser aplicado e da iniciativa em si de exploração de petróleo.

Tenho o maior respeito pelo senador Tião Viana, do qual sou eleitor. Como tal, e também por atuar na área ambiental há muitos anos, em especial trabalhando com o Ibama, para que este viabilize o funcionamento do PNSD, me sinto responsável por comentar e lançar algumas questões, com a finalidade de refletir mais sobre o assunto, sobretudo nesta fase em que a humanidade constata as transformações negativas do ambiente para a sua vida no planeta e busca indicativos para evitar uma catástrofe maior para a atual e futuras gerações.

Desde 1934 estes minerais, principalmente o petróleo, motivaram prospecções no Acre, especificamente na Serra do Divisor, nas margens do Rio Moa, em Mâncio Lima. Uma das perfurações remanescentes naquela região (o Buraco da Central), de onde hoje jorra água sulfurosa e morna continuamente, como também os restos da caldeira que foi levada até lá naquela década, confirmam tal empreitada. Entretanto, o que tudo indica é que o potencial existente não justificou a exploração.

Ecoturismo
A exploração de petróleo é dinheiro certo. Caso venha de fato a acontecer, trará muitos recursos e empregos para os municípios acreanos. Porém, a exploração pelo homem do recurso natural petróleo, o transformou em um dos principais motivos para acelerar o efeito estufa e as mudanças climáticas que estão em curso. Apesar da tecnologia moderna e avançada, sua exploração é responsável pelos mais graves acidentes ambientais no planeta, que causam fortes alterações aos ambientes afetados e as populações atingidas.

Surpreendido por tal iniciativa, e diante dos efeitos negativos causados ao meio ambiente por uma atividade como a exploração de petróleo, gostaria de sugerir ao ilustre senador Tiao Viana, que empreendesse esforço semelhante para alocar recurso menor ou da mesma monta, no Parque Nacional da Serra do Divisor, potencializando na região uma das maiores indústrias do planeta - o turismo ou ecoturismo. Essa indústria gera grandes volumes de recursos e empregos, sem causar 5% do impacto ambiental e social que o petróleo causa. O ecoturismo pode promover a conservação da região que concentra um dos mais altos níveis de biodiversidade da Amazônia.

Para estruturar o parque, seus atrativos e preparar as comunidades locais a empreenderem atividades que promovam o ecoturismo na região, seriam necessários menos de 30% dos R$ 75 milhões previstos à prospecção do petróleo e do gás. Tais informações estão disponíveis no Plano de Manejo do Parque, elaborado pela SOS Amazônia e aprovado pelo Ibama desde 1998, e no Plano de Uso Público do Parque, desde 2002. Infelizmente, parece que a falta de integração e comunicação é um problema que afeta também a relação do parlamento com o poder executivo, tanto no Acre como no País.

Governo da Floresta
Mesmo não querendo ser contrário a tal iniciativa, ao calcular o valor das compensações ambientais que uma exploração de petróleo deverá conceder em forma de recursos, provavelmente um montante capaz de consolidar o Parque Nacional, tenho de persistir na preocupação, sendo possível concluir que o desenvolvimento econômico pretendido tem como base uma atividade de grande impacto ao meio ambiente. Neste caso - o que é mais grave - vem fomentar a base energética que mais tem contribuído com o efeito estufa.

Por outro lado, diante das conclusões e constatações sobre as mudanças climáticas, anunciadas pela ONU em relatório oficial do dia 3 de fevereiro, pergunto: Por que não se intensifica na Amazônia, particularmente no Acre, os empreendimentos com a floresta em pé, sem vivenciar ameaças tão sérias, já que no nosso Estado estamos há mais de 8 anos sob a gestão de um governo que se anuncia o “Governo da Floresta “?

Quero ressaltar que o que se tem empreendido aqui no Acre em relação às florestas é muito importante, mas não é o suficiente para conservar a biodiversidade e se apresentar como alternativa às vantagens econômicas que a criação de gado propicia, pois nenhum custo ambiental esta atividade embute nos preços praticados no comércio da carne bovina.

Para ilustrar um pouco as minhas preocupações, menciono um fato que considero também muito relevante. Enquanto nossos dirigentes partem para tal empreitada, nossos vizinhos peruanos da região de Ucayali, em particular as comunidades indígenas, rechaçaram a iniciativa do governo peruano em licitar prospecção de gás e petróleo em lotes de áreas situadas na fronteira com o Parque Nacional da Serra do Divisor e outras áreas protegidas no Alto Yuruá, muitas delas com fortes indicativos de concentrarem índios isolados. Tal iniciativa deu resultado e os processos foram suspensos.

No nosso caso, isto ainda nem entrou em questão. Espero que a área indicada à prospecção não seja o Parque Nacional da Serra do Divisor ou qualquer outra área de proteção no Juruá, que por sinal tem 60% do seu território ocupado por áreas protegidas, como a Reserva Extrativista do Alto Juruá, o Parque Nacional da Serra do Divisor, várias terras indígenas e projetos de desenvolvimento Sustentável.

Defesa da população
Diante da avalanche de territórios selecionados na gestão do presidente Lula, para grandes empreendimentos na Amazônia, receio que no Acre possa acontecer o mesmo que em Rondônia, quando se decidiu construir as duas hidroelétricas e a hidrovia no Rio Madeira: não houve repasse antecipado de informação e discussões prévias com as comunidades da região. Quando o projeto foi anunciado, o mesmo já estava pronto e acertado. As audiências que ocorreram foram apenas para fazer os acertos finais e melhorar os acordos políticos.

Por termos visto isto acontecer, principalmente em épocas passadas, é que ficamos receosos de que, aos envolvidos, sejam apresentados apenas os benefícios. Os problemas e as conseqüências ruins, cientificamente comprovadas, serão, se for o caso, tratadas somente depois pela próxima geração, pois a atual só pensa no agora. Exemplos não faltam. Tanto que hoje são os responsáveis pelo caos ambiental e social que o planeta exibe, mesmo com tantos avanços e melhorias que a vida do ser humano possui, em comparação aos séculos passados.

Por anos, tenho tido posicionamentos que buscam combinar e equilibrar as atividades econômicas atuais (mantidas as devidas exceções, estas inaceitáveis), com a conservação ambiental. Entretanto, parece que não tenho conseguido me fazer entender. De maneira nenhuma, com este artigo, quero ser contra a melhoria de vida das nossas populações, muito pelo contrário. Como um cidadão que tem compromisso em trabalhar para que a democracia seja aperfeiçoada e a justiça social seja a premissa das relações na nossa sociedade, quero dar mais elementos ao debate e ajudar nossos governantes, parlamentares e juristas a decidirem por caminhos aos quais eu, muitos amigos e outras centenas de milhares de pessoas, boa parte eleitores dos atuais governos do Acre e do Brasil, consideramos os mais adequados para a realidade em que vivemos e a qual devemos estar sempre transformando para melhor.

Miguel Scarcello é ambientalista, professor de geografia e secretário da Associação SOS Amazônia. Empresários dizem que pesquisas da ANP no Acre vão aquecer economia local. Leia mais.

PETRÓLEO E GÁS NO ACRE

Do jornalista Antonio Alves, assessor especial do governador Binho Marques (PT), a respeito da emenda de R$ 75 milhões ao Orçamento Geral da União, de autoria do senador Tião Viana (PT), para que a Agência Nacional do Petróleo desenvolva estudos de prospecção de gás e petróleo na fronteira com a Bolívia e Peru:

- Como cidadão é meu dever calar caso encontrasse petróleo em minha terra. A exploração de minério e petróleo, que enriquece as corporações, tem deixado apenas um rastro de destruição social e ambiental no planeta.

Impressionante que a Fundação SOS Amazônia, dirigida por Miguel Scarcello, não tenha ainda se manifestado sobre a questão, pois a organização tem atuado em defesa da conservação do Parque Nacional da Serra do Divisor, na fronteira Brasil-Peru, onde pode existir o petróleo do Acre.

O antropólogo Marcelo Piedrafita em carta a este blog já advertiu sobre os riscos a que estão expostos povos e a natureza com a exploração de petróleo do lado peruano. Leia aqui.

O MENINO E A MOEDA

Leila Jalul

Pouco escrevi sobre os heróis contemporâneos Chico Mendes e Wilson Pinheiro, que aparece na foto ao lado. Jornalistas, historiadores, antropólogos e sociólogos fizeram isso. Relatos e reportagens, alguns com histórias vividas junto aos líderes seringueiros, com certeza, foram mais fiéis aos fatos.

Por terem ideais e sofrimentos compartilhados, atribuo aos jornalistas acreanos, desde o Varadouro, e outros, a edição dos fatos dentro do rigor da verdade. Outras divulgações embutem fantasias, lições de oportunismo e inverdades. Excetuo, como sempre, as que tenham algum valor.

Foi no tempo do governador Joaquim Macedo que Wilson Pinheiro foi assassinado. Nada que se parecesse com o auê formado quando da morte de Chico Mendes. Por uma razão simples: não se tratava de morte anunciada. Em Xapuri, o chefe do Gabinete Civil, Elias Mansour, ministrava uma palestra para os alunos de licenciatura parcelada em letras e pedagogia. Eu representava a Universidade Federal do Acre na cidade.

A notícia da morte do líder seringueiro voou rápida. Dali mesmo, zarpamos para Brasiléia, direto para a casa que abrigava o sindicato onde, ainda quente, estava estirado o seringueiro. Elias Mansour retorna para Rio Branco. Era necessário cumprir ações de governo que o fato exigia. E ali me deixou, sem conhecer ninguém, exceto o defunto e o médico Tufic Saad, irmão do Edu.

Não me exijo exatidão no que narro, considerando o tempo, o elemento surpresa, mas muita coisa gravei da cena. Na sala comprida, uns quase trinta homens se postaram ao fundo, com chapéus nas mãos, em tom de luto e, no início, o corpo, o médico, eu e uma outra criatura que julgo ser um agente de saúde.

Nada de dissecação de cadáver ou de qualquer outro procedimento médico apropriado, exceto a injeção de formol para a conservação do defunto pelo tempo preciso, até que seus companheiros de “empate” chegassem para as últimas homenagens.

Doutor Tufic, só por força da profissão, agüentou a tarefa. No meu caso, no do outro ajudante, apenas pela solidariedade. A sala ardia, nossos olhos queimavam, o silêncio daqueles homens doía, ensurdecia e, ao mesmo tempo, encorajavam.

Aí aparece um menino. Menino, modo de dizer, pela idade e pelo tamanho. Dos seus olhos, claramente saía um sentimento adulto de perda, de dor, de inconformismo. Pareciam querer negar a sua condição. Sai do fundo da sala, de dentre os homens, abre a boca de Wilson e, debaixo da língua, introduz uma moeda.

Não me perguntem de quanto, mas não entendi nada. Acho que o médico, menos ainda. Mas, quem sabe, um último desejo? Uma promessa? Um adjutório para que Wilson pudesse pagar seu ingresso na catraca do céu?

Terminado o suplício do formol, começou a chegar gente. Gente do mato, dos seringais e dos ramais. E, para surpresa geral, aparece um tal de Nilo, capataz de um fazendeiro. Entrou, olhou ao derredor, cumprimentou a um e a outro e se foi.

Sempre me disseram que estou meia hora atrás dos calendários e dos relógios. O certo é que depois fiquei sabendo que eliminaram o Nilo, numa espécie de ação coletiva, sem identificação de autoria, e a moeda era uma simpatia infalível para desvendar crimes.

Ora, se o criminoso costuma voltar ao local do crime, naquele o Nilo se deu mal. Mesmo sem relógio e calendário, sei que o menino cresceu, mataram o Chico Mendes e sei que o Wilson virou nome de ponte. Isso mesmo. Virou ponte.