segunda-feira, 26 de março de 2007

SOCIALMENTE CORRETA

Letícia Spiller, a Anália da minissérie ‘Amazônia’, fala de sua experiência com os índios e de sua preocupação com os rumos do país

A atriz, que já esteve quatro vezes na Amazônia desde 2005, prepara um documentário sobre o esforço de preservação que viu por lá



Lilian Fernandes

As mulheres dos seringueiros achavam graça, mas Letícia Spiller falava sério quando pedia que elas lhe ensinassem a desempenhar suas tarefas diárias, durante a temporada que passou numa colocação próxima a Xapuri, no Acre, fazendo laboratório e gravando suas primeiras cenas como a fogosa Anália de "Amazônia".

- Eu dizia: "E aí, gente, bora lavar roupa?". E elas riam. Mas eu precisava aprender a lavar roupa no igarapé, preparar galinha cabidela, decorar as músicas que elas cantarolam quando estão cozinhando ou botando as crianças para dormir. O trabalho que não tem esta vivência é sempre mais difícil — diz Letícia, que também fez bronzeamento artificial e usou um aplique feito com cabelos importados da Índia para compor Anália. — Minha maior inspiração foi a dona Cecília, tia de Chico Mendes.

Nesta viagem, em outubro do ano passado, Letícia pernoitou no meio da mata, viu seringueiros abrirem as chamadas estradas de seringa e visitou museus em Xapuri e Rio Branco. Mas sua intimidade com a cultura acreana foi estabelecida antes: desde o final de 2005, ela já estivera três vezes no estado. Na primeira, acompanhou um amigo numa visita aos índios ashaninka, buscando inspiração para viver Anita Garibaldi no cinema. Mas que relação pode haver entre os índios acreanos e a revolucionária gaúcha?

- Assim como a Anita, os ashaninka são guerreiros e lutam por um bem maior, pela comunidade. Eles têm um trabalho exemplar de manejo sustentável, e estão resgatando suas tradições.

O convívio com a tribo resultou na produção do documentário "Escola da floresta", em que ela pretende mostrar o esforço conjunto, de cidadãos comuns e governantes, para criar a instituição homônima, onde acreanos e turistas aprenderão a preservar e recuperar o meio ambiente.

- Desci o rio Juruá de canoa com o Benki, para conscientizar as comunidades ribeirinhas da necessidade de se preservar os recursos da floresta. Em alguns lugares, as pessoas estavam passando fome, porque as plantações haviam sido substituídas por pastos. Eu nem tinha levado câmera, porque não queria que nada fizesse as pessoas estranharem a minha presença, e acabamos registrando imagens com a máquina do meu amigo. Mas, quando fui reconhecida até em Marechal Thaumaturgo, último município da fronteira (com o Peru), pensei: "Caramba, eu posso ajudar a divulgar este trabalho".

Por coincidência, os ashaninka também orientaram a equipe de "Amazônia" — e a atriz diz que sua Anália, mulher fogosa que se envolve com o coronel Augusto (Humberto Martins) com o consentimento tácito do marido, é uma mistura dos irmãos Benki e Shantsy, que se tornaram seus amigos e presentearam-na com o belo colar aí ao lado.

- A Anália é uma mulher forte, mas quase ingênua, sensual e livre de preconceitos, preocupada em garantir o sustento dos seus filhos. Ao mesmo tempo, ela gosta do coronel, que foi seu primeiro homem — diz a atriz.

A proteção do coronel não vai durar muito: ao final da segunda fase da minissérie, nesta sexta-feira, a família de Anália será expulsa do seringal. "Amazônia", porém, não é o assunto preferido de Letícia neste momento. Durante a maior parte do tempo em que conversou com o GLOBO, ela preferiu falar de política.

- Eu fico pensando no que me interessa falar numa entrevista. E o que eu quero é alertar as pessoas. A pergunta que eu faço é: onde vai parar o meu imposto? Se eu te disser quanto pago por ano, você vai ficar chocada. Daria para sustentar umas cinco famílias com dificuldades, para este país ter escolas e hospitais de Primeiro Mundo. Mas o desvio de verbas é enorme. Não posso, porque sou uma pessoa pública, mas a vontade que tenho é de sonegar — diz, em tom indignado. — É preciso ter boa educação, mudar a lei para que garotos de 16 anos não matem inocentes e saiam impunes. Estou cansada dessas atrizes que vivem na mídia dizendo que apóiam a batalha contra o câncer de mama. Eu também apóio, mas dá para fazer mais.

Lilian Fernandes é repórter da Revista da TV, do jornal O Globo. O texto dá um bom quadro do envolvimento da Letícia Spiller com os Ashaninka e com a região. No sábado, Letícia e seu amigo Benki Ashaninka foram agredidos pelo preconceito e a intolerância do jornal A Tribuna.

3 comentários:

Anônimo disse...

Ola, Altino!
Queria primeiro lhe parabenizar pelo seu trabalho, que bom que pessoas sérias e responsáveis estão lhe apoiando.
Você e seu conhecimento da Amazônia (sobretudo seu olhar crítico), é essencial, sobretudo porque você escolheu viver, morar lá. Os frutos serão colhidos, maduros... Tenho fé em você.
Já havia lhe escrito antes no seu 'comentários' a minha indignação da matéria de "A Tribuna". e fiquei feliz de ler, por conseguinte o rebate poderoso do antropólgo Marcelo Piedrafita Iglesias e o anunciamento do Governador do Acre contra esse infeliz e preconceituoso artigo.

A atriz Leticia Spiller parece ser uma pessoa sensível e pelo fato de ter trabalho e (rosto conhecido) está com o queijo e a faca na mão...
Nada melhor que imagens e tratamento desses assuntos na midia- arma poderosíssima- para calar as bocas dos ignorantes e mostrar o belo e o grave, aos que se interessam pelo sofrimento dos seres humanos...
Um abraço.
Silvana

Saramar disse...

Gosto muito da Letícia.

Anônimo disse...

Belíssima Letícia, pode contar com o apoio de todos os anônimos. A sua bandeira é tambem nossa bandeira.
Bjos anônimos