quarta-feira, 30 de novembro de 2005

HUSHAHU E PUTANI



Por Laura Soriano Yawanawa

Kátia Hushahu e Raimunda Putani (foto) são duas mulheres jovens yawanawá -ambas têm 25 anos de idade- que nasceram na Terra Indígena do Rio Gregório, onde habita o seu povo, aqui no Acre, no sudoeste da Amazônia brasileira.

Hushahu e Putani foram as únicas mulheres que tiveram coragem de fazer juramento ao Rare, a planta sagrada do povo yawanawá, que inicia ao aprendizado do mundo espiritual do xamanismo.

Elas juraram ao Rare e aos espíritos dos ancestrais que iriam dedicar suas vidas a aprender e a ajudar o povo yawanawá na sua ciência tradicional.

Quando as duas foram iniciadas no conhecimento espiritual yawanawá, ninguém acreditava nelas, principalmente os homens da aldeia. Falavam que não existia mulher pajé dentro da cultura yawanawa e que a atitude delas era contra a cultura de seu povo.

Mas o velho e sábio Tuin Kuru falou:

– Isso não é verdade. Nosso conhecimento é espiritual e não tem nada a ver com o sexo, cor ou cheiro. Sendo homem ou mulher, todos podem podem aprender porque o nosso conhecimento é espiritual.

Putani e Hushahu, com pouco apoio da comunidade, se refugiaram no mais profundo da floresta com os pajés Tata e Yawarani e começarem o aprendizado. Passaram por provas muitos difíceis. Chegaram num determinado momento em que pensaram que fossem morrer.

Por nove meses não tomaram água tampouco comiam comida normal. Alimentavam-se de comidas muito leves e algum tipo de peixe muito pequeno, mas apenas uma vez por dia. Seu principal alimento espiritual era o uni (ayahuasca), a bebida sagrada do povo yawanawa, junto com o rume (rapé) inalado pelo nariz. Uni e rume são duas "medicinas" muito forte do conhecimento espiritual da cultura yawanawa.

Durante todo esse tempo Putani e Hushahu foram aprendendo coisas incríveis do mundo espiritual. Elas trouxeram de volta o canto de cura, desenhos incríveis, lindos e coloridos da magia do uni. Tiveram visões profundas e significativas para o povo yawanawa.

Ninguém, além dos dois velhos pajés Tata e Yawarani, conseguiu fazer até agora essa dieta que elas fizeram. Alguns membros da aldeia até que tentaram. Por falta de apoio da comunidade, acabaram desistindo e voltaram a cuidar de seus afazeres.

Agora podemos dizer que os velhos podem morrer em paz porque o povo yawanawá tem duas mulheres corajosas e jovens que seguem mantendo esse conhecimento que foi repassado para elas.

Hushahu e Putani seguem trabalhando arduamente para a preservação do conhecimento puro yawanawa. Elas agora ganharam o respeito de todos da aldeia, incluindo o respeito de todos os homens que não acreditavam nelas.

Elas agora fizeram uma promessa de falar apenas em Yawanawa. Isso é um ato muito simples, mas que está tendo grande efeito positivo na aldeia: todos agora preferem falar em yawanawa a não mais em português.

Putani e Hushahu são um grande exemplo para todas as mulheres indígenas e não indígnas. Elas estão traçando uma nova história para o povo yawanawa, onde a mulher é respeitada e escutada nas mesmas condições dos homens.

Nota do editor: Laura Soriano Yawanawa é índia de origem mexicana, das etnias mixteco e zapoteco, formada em antropologia e relações internacionais pelo Principio College de Ilinois (EUA) e assessora dos projetos sociais e econômicos do povo yawanawa. É casada com Joaquim Tashka, um dos líderes yawanawá. O Rare que ela cita é a raiz da planta mais sagrada para o povo yawanawá. Representa o Criador. É tão sagrada que mulheres e crianças não podem passar por perto. Apenas os pajés podem tocar a raiz do Rare. Ao tomar Rare, o espírito da cobra, que é o ser iluminado e de força espiritual, vem habitar no seu coração. A partir de momento que se faz juramento ao Rare a vida muda, sobretudo a forma de pensar. A pessoa renasce e acorda para o mundo espiritual, passando a encará-lo sob nova perspectiva. A dieta de Hushahu e Putani inclui um ano de abstinência sexual. Anteontem, na aldeia, a tribo realizou uma crimônia para comemorar 10 meses da dieta que as duas já cumpriram. Esse resgate cultural começou após a tribo expulsar os missionários evangélicos da organização americana Novas Tribos, em 1986, que tentaram impor a Bíblia traduzida em língua yawanawá.

ALEX BELLOS

O jornalista e escritor inglês Alex Bellos envia a seguinte mensagem:

"Grande Altino!

Só hoje descobri seu blog. É ótimo. Estou em Londres ainda, mas com vontade de voltar para o Acre.

Abração
Alex"

Essa alma quer reza. Bellos é autor do livro "Futebol - o Brasil em campo", que escreveu quando era correspondente do jornal inglês The Gardian.

Tivemos encontros muito agradáveis em minha casa nas vezes em que veio ao Acre.

Recentemente, meu amigo Evandro Ferreira, do blog Ambiente Acreano, prometeu escrever algo sobre a "desastrada" visita de Alex Bellos a Rio Branco.


Bellos viu aqui “uma cidade marcada pelo sexo, as drogas e a expansão industrial desordenada”. Ao solicitar a um motorista de táxi que o levasse à principal atração turística-cultural da cidade, ele se viu em pleno “Beréu”, o puteiro mais famoso da aldeia.

Bellos escreveu há 10 dias um longo artigo sobre o Daime no diário inglês Daily Telegraph. Vale a pena ler mais a respeito dele em Ambiente Acreano.

P.S.: Alguém pode ajudar o Alex Bellos? Leia a nova mensagem enviada por ele:

"Altino, a minha volta ao Acre depende de poder fazer algumas materias. Uma ideia que tive era de fazer alguma coisa sobre a vida do seringueiro.

Na minha última passagem pelo Acre, ouvi falar da existência de um seringueiro perto de Boca do Acre, que mora só há muitos anos - faz décadas que ele até vai para a cidade. Tem uma vida quase igual a vida que teve 50 anos atras, quando virou seringueiro.

Seria um personagem meio perdido no tempo. Talvez você ou um dos seus visitantes saiba se existem mesmo pessoas assim - vivendo na floresta sem contato com outros, o que seria um pedaço da historia quase fossilizado na selva.

Abraços"

SAPO KAMPÔ


Nem tudo é erro no jornal Página 20, cuja redação precisa tomar reforço da "vacina" do sapo kampô, tema da boa reportagem assinada pelo jornalista Romerito Aquino:

"Ele é um pequeno sapo verde, conhecido de tempos imemoriais na floresta amazônica. Das cerca de 200 moléculas presentes em sua secreção cutânea, uma já virou a substância chamada deltorfina, medicamento internacional de ponta para evitar a isquemia cerebral. Outra resultou na dermorfina, um analgésico 40 vezes mais poderoso que a morfina.

Usada como vacina ou injeção, a secreção expelida pelo corpo do sapo verde é muito boa, segundo os índios, para dar saúde, alegria e sucesso na vida. Serve para caçar, pescar e, ainda, conseguir um amor. "Se tomar (a injeção), assim como a caça vem, a mulher também vem e não sabe nem porque", ensinam os índios. Para os curandeiros não-índios da selva, a injeção ou vacina. também já curou, nas últimas décadas, muita úlcera, gastrite, renite, malária e males do intestino e do estômago".

Reportagem completa aqui.

MAIS DO MESMO ERRO

Já não se usa mais o comando CTRL C + CTRL V como antigamente.

Embora tenha cometido um erro crasso - trocou comportas por compotas -, a editoria do jornal Página 20 publicou hoje uma notinha na qual praticamente
culpa o teclado.

O erro foi apelidado de "erro de digitação". Use o teclado para perceber a mecânica do tal "erro de digitação". Fica evidente que o erro foi de concepção, mas o editor Tião Vítor afirma:


- Um erro de digitação passou despercebido pela revisão e pela editoria na edição de ontem, quando tratou da entrevista concedida pelo senador Tião Viana (PT-AC) ao Jornal do Brasil no domingo, analisando a conjuntura política nacional. Na capa do jornal e nas páginas 4 e 5 foi atribuída ao petista a seguinte frase: “As compotas da crise já foram todas abertas”. A afirmação do senador foi: “As comportas da crise já foram todas abertas”. Ao senador e aos leitores, nossas desculpas.

Ora, ora. Não foi "quando tratou", mas quando copiou a entrevista. Além disso, custava ter dito, logo no começo: "erramos", em vez de um tal erro de digitação? Erro é erro. É uma virtude admiti-lo, mas um horror tentar justificá-lo.

São detalhes que o leitor percebe e se sente lesado. É esse o nosso jornalismo trivial. Podemos não ter o pão de cada dia, mas o circo está garantido.

terça-feira, 29 de novembro de 2005

SALVEM A AMAZÔNIA

Eu me surpreendo cada vez mais com o curso que as coisas estão tomando na nossa região. As revelações feitas por reportagens dos jornais O Estado de S. Paulo e Folha de S. Paulo são péssimos sinais de que não haverá final feliz na história da Amazônia.

Estudos sobre a floresta aumentam, e cientistas de fora do país produzem 63% dos trabalhos sem brasileiros na equipe. Confira em "Estrangeiro pesquisa mais na Amazônia".


De outro lado, um livro mostra que financiamento da pecuária na região foi milhares de vezes maior do que o do reflorestamento entre 1989 e 2002. O financiamento oficial para a pecuária bovina na Amazônia foi mais de 25 mil vezes maior do que para o reflorestamento entre 1989 e 2002.

E o Banco da Amazônia, dirigido pelo acreano Mâncio Lima, indicado pela força da política resultante da florestania, participa ativamente desse processo. Detalhes em "US$ 5,8 bi para devastar a Amazônia".

Agora não dá mais pra dizer que os governos do passado financiavam setores produtivos responsáveis pela devastação da Amazonia. O que resta é a possibilidade de mais promessas de que essa lógica bestial vai mudar.

As maiores taxas de crescimento da pecuária na Amazônia ocorreram em Rondônia (14% ao ano), Acre (12,6%/ano), Mato Grosso (8%/ano) e Pará (6%/ano).

São dados oficiais, mas existem pesquisadores que sustentam que as taxas são bem maiores. Gente que desenvolve pesquisa de campo na região, algo nada oficial, mas bem mais qualitativo que quantitativo.

Ainda bem que os estudiosos advertem que teremos, entre outros fatores, febre aftosa suficiente para afetar o futuro da pecuária na região.

Clique em "Pecuária na Amazônia: tendências e implicações para a conservação ambiental" para baixar o livro em formato PDF.

Salvem a Amazônia! Uni-vos!

MAURÍCIO BITTENCOURT


Recebi agora em meu casulo, aqui na parte mais alta e bela da cidade, a visita do paulista Maurício Bittencourt, 33, jornalista com graduação e mestrado na USP.

Ele trabalhou em rádio, revista, foi editor da homepage do Jornal da Globo e dos extintos sites Super 11 e Cidade Internet, além de "frila" do UOL. Mas desde o ano passado se dedica ao mundo acadêmico.

Maurício Bittencourt foi aprovado no concurso para professor de radiojornalismo e telejornalismo da Universidade Federal do Acre. Foi aprovado, ainda, para ser professor da Universidade Federal de Roraima, mas optou pelos encantos da resistência acreana.

Recentemente, em Santos, fui recebido com máximo carinho por Maurício e seus pais. Ele agora prepara a nova terra para receber a arquiteta Ana Paula e o filho do casal, o Caio, de dois anos.

Quem sejam bem-vindos ao Estado Independente do Acre.

SIGILO DA FONTE

Da Redação do Comunique-se

O procurador da República Bruno Caiado Acioly quer contestar na Justiça o direito da imprensa de preservar o anonimato de fontes de notícias de interesse público. O jornal O Estado de S. Paulo teve acesso a uma troca de e-mails entre Acioly e colegas do Ministério Público, nos quais ele pede subsídios aos colegas de trabalho e revela sua intenção de mover mandado de segurança para quebrar sigilo telefônico de quatro jornalistas que escreveram sobre corrupção envolvendo servidores do Banco Central e dirigentes de bancos privados.

Segundo fontes do Estadão no MP, Policarpo Júnior e Alexandre Oltramari, de Veja, e Expedido Filho, do Estado, seriam três dos quatro nomes dos profissionais que apuraram pelo telefone casos de corrupção. “É imprescindível a quebra do sigilo telefônico dos jornalistas”, escreveu num dos e-mails.

Acioly confirmou ao jornal Estado de S. Paulo a consulta aos colegas, mas negou a decisão de entrar com o mandado para quebrar a lei de proteção a fontes. “Por enquanto, é uma discussão acadêmica, teórica, para promover reflexão sobre os limites do sigilo da fonte”.

Ele afirma não ser contra o sigilo dos informantes da imprensa, que, segundo o procurador, “é uma conquista democrática do Estado de Direito”, embora defenda sua flexibilidade quando a fonte se envolve em crimes. “Um terrorista que avisa ao jornalista que vai contaminar o reservatório de água de uma cidade não deve ter seu sigilo quebrado?”, pergunta.

“A questão nevrálgica é saber se podemos ou não quebrar o sigilo telefônico do jornalista quando este se recusa a revelar seu informante, sob o fundamento do sigilo da fonte. Este sigilo é ou não relativo?”.

O procurador e a colega Raquel Branquinho já haviam entrado com medida cautelar de quebra de sigilo dos quatro jornalistas, mas a juíza Maria de Fátima de Paula Pessoa Costa, da 10ª Vara Federal, negou o pedido. O processo é sigiloso. A Polícia Federal diz que não recebeu ordem de quebra de sigilo telefônico.

Acioly é autor de ação, também em parceria com Raquel, contra o escândalo Marka FonteCindam, que provocou prejuízo de R$ 1,5 bilhão ao Erário, há seis anos.

Depois de negada a medida cautelar, movida em 25 de junho, Acioly fez a consulta aos colegas. “O pedido do mandado de segurança é a reforma da decisão que indeferiu a quebra do sigilo telefônico de quatro jornalistas, números comerciais e particulares, sob o fundamento do resguardo do sigilo da fonte”.

A quebra do sigilo, segundo Acioly, se devia “ao fato de que os quatro jornalistas invocavam constantemente o sigilo profissional para não revelar o nome do informante, provavelmente alguém de dentro do esquema”.

De acordo com matéria publicada na edição desta terça-feira (29/11) do Estadão, a maioria dos colegas ficou contra a quebra de sigilo, embora alguns tenham apoiado.

HISTÓRIA DE PERSEGUIÇÃO



Por Elson Martins

O jornal semanário Folha do Amapá, editado em Macapá, está publicando em capítulos a história que o senador João Alberto Capiberibe (PSB) viveu, a partir dos 16 anos de idade, no enfrentamento à ditadura militar de 1964.

Atualmente se defendendo de um processo de cassação, junto com sua mulher, a deputada federal Janete Capiberibe, o senador, que é autor do texto, quer mostrar às novas gerações que o casal é vítima de uma trama política articulada pelo PMDB do Amapá com a ajuda do senador Sarney, para afastá-los da disputa eleitoral de 2006.

O ex-senador Gilvan Borges, derrotado em 2002, entrou com a ação na Justiça Eleitoral acusando o casal de ter comprado dois votos por 26 reais, em duas prestações. A ação, rejeitada pelo TRE do Amapá, foi acolhida no Tribunal Superior Eleitoral e no Supremo Tribunal de Justiça. Já cassado, formalmente, o casal tenta contornar a situação com ajuda do Congresso exercendo o direito de ampla defesa.

João Alberto e Janete tornaram-se militantes da ALN (Aliança Libertadora Nacional), de Carlos Marighella, em 1968. Foram presos em Belém, em 1970, e fugiram do país em 1971 com uma filha de 8 meses. Permaneceram dois anos exilados no Chile de onde tiveram que fugir, novamente, após golpe do general Pinochet contra o socialista Salvador Allende. Estudaram quatro anos no Canadá; depois foram trabalhar em Moçambique, na África;.e retornaram ao Brasil em 1979, com a Anistia. Desde então atuam na política do Amapá filiados ao PSB (Partido Socialista Brasileiro).

Os dois se elegem continuamente desde 1988: Janete foi vereadora, deputada estadual de três mandatos e agora é deputada federal, a mais votada em 2002. João Alberto, foi prefeito de Macapá e governador do Estado durante dois mandatos seguidos (1995 a 2002). Nesse período, executou o Programa de Desenvolvimento Sustentável do Amapá (PDSA) que chamou atenção dos ambientalistas nacionais e internacionais, bem como estabeleceu um marco de mudanças na vida amapaense.

Nota: O jornalista acreano Elson Martins é da equipe de colaboradores do blog. A foto acima é do senador Capiberibe quando jovem, exilado no Chile.

COMPOTA AMARGA

“As compotas (sic) da crise já foram todas abertas”, Tião Viana.

Oh Deus! A frase acima é a sub-manchete da edição de hoje do jornal Página 20, ao reproduzir uma entrevista do senador Tião Viana (PT) ao Jornal do Brasil.

Ela está repetida em manchetão nas páginas quatro e cinco, mas foi corrigida na versão online do jornal.

Ao diretor Elson Dantas, editor Tião Vítor e revisor Beneilton Damasceno: o Houaiss explica que compota é "substantivo feminino: doce de frutas, inteiras, aos pedaços ou esmagadas, geralmente cozidas em calda de açúcar".

O vocábulo comporta tem significado diferente: "artifício de que se usa para se insinuar ou captar a confiança de outrem; lábia"

É o que falta ao Página 20.

Em Rio Branco existem quatro jornais diários, sendo alguns com edições abaixo de 200 exemplares.

Quando eu for governador do Acre, convocarei os donos de jornais para comunicá-los que vão continuar merecendo a mamata da conta do Estado sob a condição de transformarem suas empresas em apenas dois jornais.

Assegurarei investimento a ambos, sendo que um será livre para escrever o que bem entender a respeito de minha administração e o outro terá que permanecer sob a influência direta dos caprichos de minha assessoria.

Altino 2006!

domingo, 27 de novembro de 2005

SEBASTIÃO TAPAJÓS



"A AMAZÔNIA É FILHA ÚNICA"

Alegria
Um das minhas maiores alegrias como artista foi fazer a produção e os arranjos do álbum "Cantos e Contos da Floresta Nacional do Tapajós", com apoio do Ibama, trabalhando no meu habitat. Foi um trabalho feito com o coração. Fiz questão de pegar o pessoal de lá mesmo, cantando em seu habitat. Fiz uma roupagem em estúdio. É um disco muito interessante. É uma pena que existam apenas duas mil cópias. Não deu para quem queria. Quem possui uma cópia daquele CD pode se considerar um privilegiado.

Música amazônica
Ela Existe. Tenho, por exemplo, uns trabalhos que chamo de "Instrumental Caboclo", que são resquícios da minha infância, de coisas assim. "Solos da Amazônia", também, é outra prova da existência da música amazônica. Agora mesmo vou gravar um disco que chama "Nas água da Amazônia", lembrando o Rio de Janeiro onde morei muitos anos, que vai levar o título de cada capital dos Estados da Amazônia. As músicas foram feitas no barco, lá em Santarém, durante as minhas pescarias. O gosto das músicas é bem carioca mesmo.

João Donato
É meu irmão, meu amigo. Estamos sempre na batalha. Somos cidadãos do mundo. O João Donato é um músico aqui do Acre que tem um trabalho maravilhoso no mundo inteiro.

Amazônia
A Amazônia é a coqueluche do mundo, a importância maior e o maior marketing do mundo na atualidade. O mundo inteiro vive de olho na Amazônia porque a Amazônia é essa riqueza infinita. Graças a Deus a gente não vai perder isso de vista porque é necessário. As coisas acontecem mal... Você sabe do que estou falando, não é? Nós temos que cuidar da Amazônia como filha única. Cuidar para não tomarem tanta posse.

No mundo
Quando me apresento mundo afora, o maior interesse deles é conhecer a nossa região. Sempre foi assim. Há quarenta anos viajo para fora do país e meus amigos sempre dizem que vêm me visitar, que querem conhecer a nossa região. Eles acham que existem jacarés andando nas ruas. Até que tinha, não é? Sempre fui um divulgador da Amazônia. Há anos os meus cartazes fazem isso.

Lúcio Flávio Pinto
É um batalhador muito inteligente, um jornalista maravilhoso. Ele fala o que tem que falar mesmo. Acho que tem mais que ser assim. Não podemos ficar mudos. Não viemos aqui só para ouvir. Inicialmente, não viemos para ficar. Estamos de passagem por aqui e temos que falar as coisas. Contanto que não maltrate os seres, temos que falar o que é verdade. Portanto, se o que o Lúcio está falando é a verdade, tem mais é que continuar falando a verdade.

sábado, 26 de novembro de 2005

OI

Oi, Altino.

Muito obrigado por sua ativa militância em minha solidariedade. Fiquei muito sensibilizado. A propósito, mando-lhe o copião do último Jornal Pessoal, que foi ontem para as bancas.

Grande abraço,

Lúcio Flávio Pinto
Belém - Pará

Nota: Lúcio, a sua história é fonte de inspiração e sensibiliza a todos os que buscam o amor e a verdade.

JORNALISMO NA AMAZÔNIA

NO MEIO DO BLACK TIE, UM HOMEM DO POVO

Lúcio Flávio Pinto

Esta é a saudação que escrevi para minha filha, Juliana Pinto, ler durante a solenidade de entrega do Prêmio Internacional Liberdade de Imprensa, no dia 22, em Nova York.

Uma peça teatral reflete muito bem o que é o Brasil. Trata-se de “Eles não Usam Black Tie”. Sou um brasileiro comum, que jamais usou um black tie. Mas bem que gostaria de estar neste momento entre os senhores envergando um traje a rigor. Ele nos torna mais agradáveis, é confortável, realça ou superdimensiona algumas das nossas qualidades. É nossa vitrine glamourosa.

Nesta festa, porém, o traje é, sobretudo, um símbolo. É um traço de união entre o mundo rico e o mundo pobre. Os cidadãos afortunados que aqui se encontram concederam, referendaram ou estão a aplaudir quatro cidadãos que têm empenhado seu engenho & arte para diminuir – se não acabar – com a distância entre ricos e pobres. Têm colaborado para construir uma ponte entre os poucos que têm muito e os muitos que nada têm. Não apenas pensando em termos materiais. Raciocinando, também, com valores morais e éticos, lidando com conceitos como dignidade, liberdade, vontade, opção, alternativa.

Sabemos nós, honrados pela escolha do CPJ, que os senhores são uma boa platéia, uma plenária bem vestida e bem alimentada de ouvidos sensíveis, de olhos perspicazes, de vontades dignas, de gente decente, que não se envergonha de seu black tie, muito pelo contrário, usa-o com aprumo e elegância. Mas querendo contribuir para que todos possam vestir-se bem, comer bem, pensar bem, fazer o bem.

Venho de uma região que abriga 18% da água superficial doce desse nosso maltratado planeta e um terço das florestas tropicais que nele ainda restam. Nessas matas há a maior fonte de diversidade de vida, um volume de informações genéticas que ainda somos incapazes de dimensionar – e mais incapazes ainda de preservar para o necessário momento de estudo, revelação, controle e respeito. Apesar dessas duas grandezas básicas, em escala planetária, temos nos notabilizado como predadores justamente dessas que são nossas maiores riquezas.

Nenhum povo destruiu mais floresta, em tão curto prazo, como os colonizadores contemporâneos da Amazônia fizeram em apenas meio século. O desmatamento já consumado na Amazônia equivale a uma área duas vezes e meia maior do que o Estado de São Paulo, que concentra em seu território um terço da riqueza brasileira, ou 700 mil quilômetros quadrados. Na década de 60, ela representava menos de 1% da Amazônia. Hoje, está chegando a 20%. É uma devastação terrível e um desperdício criminoso de recursos naturais, muitos dos quais nem chegaram a ser inventariados.

Não se lance culpa execrável sobre os colonizadores da Amazônia. Foi assim em toda história da humanidade. Depois de nos tornarmos Homo Sapiens, nos restringimos a ser Homo Agrícola no trato com a natureza. Nunca nos consolidamos como Homo Floresta. A história da expansão física da sociedade humana é a história da devastação de suas florestas. Nossa cultura é a do desmatamento.

Agora, porém, temos a oportunidade única de usar a experiência da destruição e os conhecimentos já acumulados no trato com a natureza para escrevermos na Amazônia uma história inédita, centrada na manutenção da floresta e não na sua extirpação. É a última oportunidade que a humanidade tem de fundar o Homo Floresta.

Esse “capítulo do Gênesis” que o criador não escreveu, transferindo-o para a responsabilidade de sua criatura, ainda é possível. Mas a cada dia essa possibilidade se distancia do plano da realidade. Se ela for exeqüível, só o será com a participação dos homens de boa vontade do mundo inteiro. O capital já descobriu que a Amazônia é um lugar excelente para se reproduzir e se multiplicar. A Amazônia já faz parte do circuito internacional do capital, fornecendo produtos como os minérios, a madeira, algumas outras matérias primas e, através de biombos, informações genéticas valiosíssimas. É hora de entrar em ação o circuito do saber, da informação, da solidariedade do conhecimento.

Com tanta água, a Amazônia não sabe manejá-la. Vivemos agora o impacto de uma seca como nunca se imaginou que fosse acontecer. O abastecimento de água potável é um grande problema nas cidades. No campo, já há regiões onde a água só pode ser captada em grandes profundidades. O equilíbrio ecológico, que permite à floresta viver dela mesma, foi rompido e está ameaçado de destruição antes mesmo que tenhamos podido compreendê-lo.

Só compreenderemos tudo isso, tornando-nos parceiros verdadeiramente inteligentes dos caprichos que a natureza aplicou na Amazônia, se contarmos com a solidariedade dos povos que mais se adiantaram na produção científica e tecnológica, num projeto verdadeiramente humanista, generosamente partilhado. Só assim a Amazônia escapará ao destino que o bwana lhe traçou, condenando-a a ser uma vil repetição do que aconteceu na África e na Ásia.

Neste dia em que não pude vestir meu black tie e vir a esta bonita festa, na capital do mundo, atado que me encontro nas teias sórdidas montadas pelos que querem sufocar meu jornalismo crítico, comprometido em transformar a verdade na arma de libertação de que falava o profeta bíblico, mando-lhes o apelo das selvas, à maneira de Jack London, o grande jornalista de outras fronteiras no mundo: estendam suas pontes a este lado do mundo. Embarquem no desafio de construir uma civilização e uma cultura da floresta nesse Éden que o grande criador delegou à nossa criação – humana, demasiadamente humana. Que os ensaios de garranchos sejam substituídos por uma página bem escrita, na qual a inteligência crie um mundo novo, melhor e mais justo, como nós todos desejamos. Com black tie ou em mangas de camisa, não faz diferença.

Muito obrigado.

Nota: O jornalista paraense Lúcio Flávio Pinto é editor do Jornal Pessoal. Existe uma campanha mundial para cessar a perseguição contra ele. Clique aqui para assinar a carta em solidariedade ao jornalista.

sexta-feira, 25 de novembro de 2005

ALMANAQUE ABRIL

O Google não é satisfatório para suas pesquisas e você tem interesse em adquirir o Almanaque Abril 2005, para gravá-lo em CD? Para isso existe gente diponibilizando cópia na web e, para baixá-lo, basta clicar em parte 1 e parte 2. O brasileiro é um "fenome" interessante. Até o acesso a este blog chega a crescer quando existe nota sobre pirataria na web. O pessoal parece que não ganha suficiente bem pra pagar R$ 31,46 pelo CD do grupo que edita a revista Veja. Não baixei, não testei e também não recomendo o uso de software pirata.

FLORA SONORA


Passei uma chuva ontem, à boca-da-noite, no Horto Florestal de Rio Branco, onde acontece até domingo a XI Feira dos Produtos da Floresta. O evento é adequado ao ambiente acreano, mas, infelizmente, não conta com suficiente empenho e investimento financeiro do poder público e da iniciativa privada, que preferem o faroeste das breguíssimas feiras agropecuárias do Acre.

Além dos produtos florestais e agroflorestais, o que mais chamou minha atenção foi a Oficina Som da Floresta, uma bela iniciativa tocada pela Associação Vertente, na qual estão envolvidas 30 crianças dos bairros Wanderley Dantas e Adalberto Sena, com o apoio da Secretaria Estadual de Educação.

É impressionante ouvir a música que as crianças, de cinco a 13 anos, tiram de bumbos confeccionados de latas de tintas, chocalhos de garrafas peti, canos e tantos outros instrumentos de percussão, de ouriços de castanha, bambu, madeira e variados materiais recicláveis. A Oficina Som da Floresta é considerada um "ponto de cultura" pelo Ministério da Cultura.

As crianças da periferia formam um bom grupo de percussão e até já reinventaram, em ritmo de samba, as tristonhas interpretações oficiais do "hino de nação" que o Acre ama cantar.

A atividade das crianças é extra-curricular. Não são meninos ou meninas de rua, mas estavam nas ruas de seus bairros apenas jogando bola e soltando pipa. Aprendem agora sobre a diversidade musical, com ênfase na cultura acreana, especialmente nos sons da floresta.

Quem estiver interessado em convidar ou conhecer melhor a Oficina Som da Floresta deve telefonar para 68 3028 1005 ou clicar aqui para enviar mensagem para a Associação Vertente. A coordenadora do projeto é Célia Pedrina.

A Flora foi criada para promover a valorização da diversidade da floresta amazônica com a divulgação dos produtos florestais e agroflorestais, mostrando a viabilidade das alternativas sustentáveis para as populações tradicionais, além de chamar a atenção da opinião pública para a importância do trabalho agraoextrativista na conservação e desenvolvimento sustentável.

O tema da feira neste ano é "Floresta: Vida Nossa de Cada Dia". A floresta é o elemento fundamental da sustentabilidade do desenvolvimento socioeconômico, ambiental e cultural das populações locais.

Valores sociais, culturais, históricos e ambientais estão presentes nos trabalhos expostos. Grupos organizados de diferentes regiões do Acre e de outros Estados da Amazônia, entidades governamentais, e não-governamentais, incluindo os vizinhos Peru e Bolívia, estão presentes como parceiros do evento.

Há exposição de produtos variados, rodadas de negócios, seminário sobre a valoração ambiental da floresta, oficinas temáticas e práticas, e uma vasta programação cultural com artistas da terra. O site da Flora é desanimado e vazio quando comparado à agitação que acontece durante o evento. Clique aqui para conferir.

Voltarei à feira amanhã, para assistir shows de meus amigos conterrâneos Sérgio Souto e Pia Vila. Sérgio, entre outras belas canções, compôs "Lembrando de você", em parceria com Moacyr Luz.

Simão Pessoa, jornalista amazonense, autor do
"Manual do Canalha - Uma Estética Machista Para o Terceiro Milenio", sempre que nos encontramos, afirma:

- Eu não posso acreditar que um acreano seja um dos compositores de "Lembrando de você".

Bem, o Pia Vila é um dos inventores do mastigadinho, um ritmo acreano do qual não dá pra falar agora porque é bom demais e falta espaço. Por lá estarão, ainda, no sábado, os renomados compositores Sebastião Tapajós e Nilson Chaves.

Se fosse a feira agropecuária, seria Bruno e Marrone, Calcinha Preta, Calypso... Complete a lista.

quinta-feira, 24 de novembro de 2005

MUNDINHO ARTEIRO

A CHUVA E O COQUEIRO


Chuva boa no Horto Florestal de Rio Branco, às 19h20

MADALENA ARREPENDIDA?

Por Edson Gillet (*)

O papel de Madalena arrependida do Ronaldo Maiorana diante do Comunique-se não corresponde à veracidade dos fatos. Os processos efetivados por ele na Justiça, colocam o jornalista Lúcio Flávio Pinto como agressor e ele como vítima.

É um caso ímpar abaixo da linha do Equador - onde quase tudo é permitido. Depois de agredir, o meliante limpa o sangue das mãos e inverte os fatos, dizendo-se agredido. Mesmo sem ter nenhuma escoriação visível.

Quanto às ofensas aos pais, também não procedem. Tenho todos os números do Jornal Pessoal, editado por Lúcio Flávio Pinto. Em nenhum artigo o jornalista chama a mãe de Ronaldo Maiorana de prostituta.

Quanto ao Rômulo, pai do Ronaldo, Lúcio faz citações no artigo "O Rei da Quintanda" sobre como ele (Rômulo) teve que usar de arranjos (laranjas) para se tornar proprietário da TV Liberal e garantir o vínculo com a Rede Globo, por causa de sua ligação com o contrabando.

Coisa imperdoável aos poderosos de plantão à época. Ou seja: o jornalista contou a verdade, coisa que incomoda os Maiorana.


Quanto ao direito de resposta, segundo o Lúcio, Ronaldo nunca sequer encaminhou alguma carta ao Jornal Pessoal. E no artigo "O Rei da Quitanda", em que se diz ofendido, ele nem sequer é citado em nenhum trecho do mesmo.

Ronaldo esperou 19 anos para responder e quando respondeu foi com um ato de covardia, próprio daqueles que se julgam tutores da liberdade de impensa.

Usou o braço armado do Estado (policiais militares, pagos com dinheiro do contribuinte) e agora usa a máquina da Justiça em causa própria ao som do tilintar das moedas.


(*) Edson Gillet é jornalista em Belém (PA)

DESCOBRIMENTO



Mário de Andrade

Abancado à escrivaninha em São Paulo
Na minha casa da rua Lopes Chaves
De supetão senti um friúme por dentro.
Fiquei trêmulo, muito comovido
Com o livro palerma olhando pra mim.

Não vê que me lembrei que lá no Norte, meu Deus!
muito longe de mim
Na escuridão ativa da noite que caiu
Um homem pálido magro de cabelo escorrendo nos olhos,
Depois de fazer uma pele com a borracha do dia,
Faz pouco se deitou, está dormindo.

Esse homem é brasileiro que nem eu.

Nota do blog:
Fui sugestionado a reproduzir o poema "Descobrimento" por minha amiga Gisela Brugnara, uma arquiteta que nasceu lá em São Paulo e mora em Rio Branco, a quem está concedido publicamente o informal título de cidadã acreana. "Dois poemas acreanos" (Descobrimento e Acalanto do Seringueiro) foram escritos em 1925. Em "Acalanto..." ele pergunta: "Como será a escureza/ Desse mato-virgem do Acre?" Estará aqui em breve. O Acre foi chamado pelo escritor paulista de "irmão caçula" no poema "Noturno de Belo Horizonte". Quanta falta a poesia faz aos homens.

quarta-feira, 23 de novembro de 2005

DEU NO COMUNIQUE-SE

"Me arrependo do que fiz", diz Ronaldo Maiorana

Da Redação

“Agredi sim, fui infantil, errei. Ele prestou queixa e eu paguei por isso. Me arrependo do que fiz”. Ronaldo Maiorana, diretor-editor do jornal O Liberal, disse, em entrevista ao Comunique-se na noite desta segunda-feira (21/11), que todos os processos que tem contra o jornalista Lúcio Flávio Pinto correspondem ao direito que tem de defesa. “Há 19 anos que ele (Lúcio Flávio) me ofende, ofende meus pais e minha família. O Lúcio nunca me procurou para ouvir o que eu tenho a dizer. Nunca exerci meu direito de resposta”, queixa-se o empresário e jornalista. Ele agrediu Lúcio Flávio no início deste ano, num restaurante no Pará, e condenado pela Justiça a pagar R$ 6,5 mil em cestas básicas para instituições de caridade.

Maiorana foi procurado nesta segunda pela nossa redação para falar da ciberação que as Redes de Jornalistas Ambientalistas Brasileiros e de Jornalistas da Amazônia (Cipó) e da ONG Ecologia em Ação prepararam pedindo o fim da perseguição ao editor do Jornal Pessoal, que não pôde viajar para Nova York para receber o Prêmio Internacional da Liberdade de Imprensa, concedido pela organização Comitê para a Proteção de Jornalistas (CPJ - Committee to Protect Journalists). Juliana da Cunha Pinto, filha de Lúcio Flávio, está nos Estados Unidos representando o pai.

“Ele não viajou porque não quis. A Justiça do Pará não o impede de sair do País. O Lúcio adora se fazer de vítima”, rebateu Maiorana.

O diretor-editor se diz a favor da liberdade de expressão, mas lembra que a Justiça lhe garante o direito de processar quem ofender sua honra. “O Lúcio já chamou minha mãe de p... e meu pai de contrabandista. Não posso ler isso e ficar calado”.

O Comunique-se abriu espaço tanto para Lúcio Flávio Pinto quanto para Ronaldo Maiorana conversarem com os usuários do portal sobre toda essa questão e também sobre suas carreiras no jornalismo. Lúcio Flávio participa do “Papo na Redação” no dia 01/12, às 15h, enquanto o chat com Maiorana acontece no dia 07/12, às 17h.

ENDANGERED JOURNALISTS

Quem quiser prestar solidariedade ao jornalista Lúcio Flávio Pinto deve clicar em português ou inglês para ler e assinar a carta.

Eis o
editorial do Washington Post:

IT'S A MEASURE of the political dangers facing journalists in much of the world that two of the four winners of this year's International Press Freedom Awards couldn't make it to New York City to pick up their prizes tonight. A third will be there, but doesn't dare go home. And the fourth is, for the first time in the history of the awards, not a journalist at all, but a media lawyer from a nation that basically has no more free journalists to honor. The Committee to Protect Journalists (CPJ), in choosing this year's honorees, not only highlighted the almost unimaginable bravery of reporters and their advocates seeking to work in repressive environments; it also demonstrated that, in too many of those environments, the repressers are winning, at least for now.

One absent winner will be Shi Tao, 37, a Chinese journalist serving a 10-year sentence for "leaking state secrets abroad." The "secrets" he posted on the Internet were from a Propaganda Department memo telling Chinese journalists how to cover (or not) the 15th anniversary of the Tiananmen Square massacre. In other words, Mr. Shi was imprisoned for reporting on how the Chinese government keeps other journalists from doing their jobs. His case, sadly not surprising under the current Chinese regime, was made possible by cooperation between Chinese police and the U.S. company Yahoo, eager to maintain access to China's market.

Also missing from tonight's award ceremony will be Lcio Flvio Pinto, 56, a newspaper editor in Brazil's Amazon region. He's not in prison, but the corrupt businessmen and local officials he writes about have filed so many harassing lawsuits against him that he dare not leave his home: One missed court appearance would give authorities an excuse to put him in jail, according to the CPJ. Meanwhile, Uzbekistan's Galima Bukharbaeva, 31, who bravely reported on a May 13 massacre of civilians in the city of Andijan, cannot return to the former Soviet republic still ruled by its old communist boss, for fear of imprisonment or other reprisal. "The last years of the Soviet Union were paradise for journalists compared to today in Uzbekistan," she said.

In Zimbabwe, lawyer Beatrice Mtetwa, 47, has gone to court on behalf of independent newspapers and journalists, even as dictator Robert Mugabe has closed the papers one by one and forced the journalists into exile. Ms. Mtetwa herself has been followed and arrested and beaten, but in a conversation last week she sounded more concerned about what the absence of a free press means for her country: "The government can really do what it likes, because there is no one to report on what they are doing."

That is the goal, of course, of dictators from Burma to Belarus. But in those nations, as in China, Zimbabwe and Uzbekistan, brave reporters and editors either inside the countries or in exile keep trying to do their work. As the CPJ will note tonight, they deserve the respect and support of everyone lucky enough to take press freedoms for granted.

LIBERDADE PRECÁRIA

O editor do Observatório da Imprensa Online, Luiz Egypto, citou hoje Lúcio Flávio Pinto no rádio para exemplificar que é difícil exercer a liberdade de imprensa em certas regiões do país.

Egypto:

- O jornalista paraense Lúcio Flávio Pinto vive um paradoxo que seria curioso se não fosse absurdo. Ele é editor do Jornal Pessoal, de Belém do Pará, e repórter com décadas de experiência na cobertura de assuntos da Amazônia. Lúcio foi um dos três jornalistas escolhidos para receber o Prêmio Internacional da Liberdade de Imprensa, concedido pelo Comitê para a Proteção dos Jornalistas, organização não-governamental com sede nos Estados Unidos.

O jantar em homenagem aos premiados realizou-se ontem, terça, no antigo e ainda elegante hotel Waldorf Astoria, em Nova York. Mas Lúcio não pôde comparecer. Ele não saiu de Belém para não correr o risco de perder algum prazo nos 18 processos que responde em razão de seu trabalho jornalístico. São processos que têm duas características em comum: todos são baseados na Lei de Imprensa, entulho autoritário em vigor desde 1967, e todos derivam de matérias envolvendo assuntos de interesse público, em especial a grilagem de terras na Região Amazônica. Liberdade de imprensa é isso aí.

Nota: O programa do Observatório da Imprensa no rádio tem duração de cinco minutos, apresentado pelo jornalista Mauro Malin e com participação de Alberto Dines. É transmitido de segunda a sexta-feira, às 9h, pela Cultura FM (103,3 mHz) de São Paulo e, no Rio de Janeiro, pela Rádio MEC AM (800 kHz), às 10h, e Rádio MEC FM (98.9 mHz), às 10h05.

DEPUTADO SOLIDÁRIO

O deputado Moisés Diniz (PC do B) apresentou requerimento hoje, na Assembléia Legislativa do Acre, exigindo o fim das perseguições ao jornalista Lúcio Flávio Pinto.

A proposição será enviada ao diretor-presidente do grupo Organizações Rômulo Maiorana, no Pará, presidente da OAB, presidente da OAB-Pará, presidente da Associação Nacional de Jornais, presidente do Tribunal de Justiça do Pará, às Organizações Globo, ao Ministro de Justiça e ao presidente da Federação Nacional dos Jornalistas.


Lúcio Flávio Pinto responde a 19 processos na Justiça do Pará. A maioria é movida por integrantes da família Maiorana, proprietária da Rede ORM, que edita o jornal O Liberal e é concessionária da TV Liberal, afiliada da Rede Globo. Em janeiro, em um restaurante de Belém, Lúcio Flávio Pinto brutalmente espancado por Ronaldo Maiorana, com o auxílio de dois guarda-costas.

- O jornalista produziu faíscas no depósito das letras inflamáveis da elite paraense. Uma elite que trata os jornais como latifúndio. No lugar de bois, letras. A linha editorial é a cerca de arame farpado que fere e protege os latifúndios das letras. Usam os tribunais e até capangas para ferir aqueles que ameaçarem os seus pastos, negociados nas grandes empresas e nos escritórios públicos - afirma o deputado.

Segundo Diniz, "quando surge um jornalista limpo, que insiste em viver sob os temporais da verdade, as bestas das redações reagem como bispos do Santo Ofício".

- Vetam os seus textos e o alimento dos seus filhos. Insatisfeitos, agem nos tribunais e até contratam capangas. É a eterna luta entre a consciência e o lucro. Lúcio Flávio Pinto está pagando o preço de ser limpo - finalizou o parlamentar.

DEU NO WASHINGTON POST

Elias Pinto (*)

É isso mesmo. A luta de Lúcio Flávio Pinto foi parar no teto do mundo, no centro da nação mais poderosa do planeta. É isso mesmo: deu no Washington Post. Um dos mais importantes e influentes jornais do mundo dedicou seu espaço mais nobre, o editorial, para comentar a entrega do prestigiado Prêmio Internacional da Liberdade de Imprensa, conferido pelo Comitê para a Proteção dos Jornalistas (CPJ), uma respeitada organização independente (é dirigida pelo editor-executivo do Wall Street Journal) com sede em Nova York, onde ocorreu, ontem, a cerimônia de premiação, no hotel Waldorf-Astoria.

Como o leitor sabe, Lúcio foi um dos premiados (o único das Américas), junto com dois outros jornalistas, o chinês Shi Tao e a usbeque Galima Bukharbaeva, além de Beatrice Mtetwa, advogada especializada em mídia, incansável defensora da liberdade de imprensa no Zimbábue.

O editorial (intitulado “Jornalistas ameaçados”, ou sob ameaça, sob risco de extermínio) começa chamando a atenção para o fato de que dois dos jornalistas laureados não poderiam estar presentes para receber seus prêmios exatamente por sofrerem, em seus países, os efeitos de sua atividade em favor exatamente da liberdade de imprensa – o que dá uma medida da repressão enfrentada em boa parte do mundo, observa o jornal norte-americano.


Um desses ausentes é o jornalista Shi Tao. Seus ensaios sobre reforma política, publicados em sites de notícias fora da China, atraíram a ira das autoridades. Ele cumpre atualmente uma pena de 10 anos de prisão por “vazar segredos de Estado para o exterior”.

O outro ausente à premiação, diz o Washington Post, não está preso, mas o fato de ter escrito – a partir de investigação jornalística voltada para o interesse público, a fim de expor a verdade dos fatos – sobre atividades de empresários e autoridades locais motivou uma batelada de processos contra si, com o intuito de causar-lhe embaraço no exercício do jornalismo independente, a ponto de mantê-lo praticamente sob prisão domiciliar, impedindo-o de viajar. Como já percebeu o leitor, este segundo ausente forçado, registra o Washington Post, é Lúcio Flávio Pinto. Caso viajasse a Nova York, a possibilidade de perder o prazo para algum recurso ou sofrer uma condenação, nota o Post, forneceria às autoridades a justificativa para pedir até mesmo sua prisão.

O terceiro premiado poderia comparecer à cerimônia, mas não, em seguida, voltar ao seu país, informa o editorial. Refere-se à Galima Bukharbaeva, ex-correspondente no Usbequistão do Institute for War & Peace Reporting (Instituto de Informação para a Guerra e a Paz). Ela arriscou sua vida cobrindo o assassinato, pelas tropas do governo, de centenas de manifestantes. Bukharbaeva, exilada nos Estados Unidos, enfrenta, no Usbequistão, processos criminais por suas reportagens sobre repressão e tortura policial.

Finalmente, pela primeira vez na história da premiação, sublinha o Post, um dos distinguidos não é jornalista. Seu nome é Beatrice Mtetwa, advogada especializada em mídia e incansável defensora da liberdade de imprensa no Zimbábue, onde a lei é usada como arma contra jornalistas independentes. Aliás, o editorial diz que no Zimbábue nem há mais jornalistas independentes capazes de honrar esse título.

Dessas informações o leitor pode depreender que nos países citados, China, Zimbábue e Usbequistão, há forte repressão política, um estado policial, e a luta por democracia, por liberdade de imprensa, faz parte da atividade dos jornalistas (e da advogada) premiados pelo CPJ. Com exceção do Brasil.

Como já disse Lúcio Flávio Pinto, o Brasil atravessa o mais longo período de democracia em quase 120 anos como república, mas Lúcio enfrenta o paradoxo de ser perseguido e processado por fatos verdadeiros que divulga.

Daí, se há motivo para exultar que um jornal do porte do Washington Post dedique seu editorial para denunciar, com todas as letras, a perseguição ao jornalista Lúcio Flávio Pinto, ao mesmo tempo não podemos deixar de nos envergonhar de que por causa disso o jornalista não pôde comparecer para receber, ontem à noite (foi representado pela filha), talvez o prêmio mais importante de sua vida jornalística, e essa ausência, no editorial do Post, nos equipara a países ditatoriais, policialescos.

Em decorrência disso, Lúcio também recebeu apoio da organização Repórteres Sem Fronteiras (a mais importante entidade representativa dos jornalistas na Europa), que enviou carta ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a outras personalidades da política brasileira, pedindo a revogação da Lei de Imprensa (em nome da qual Lúcio é processado).

A maioria dos processos contra o Lúcio é movida por integrantes da família Maiorana, que edita o jornal O Liberal e é concessionária da TV Liberal, afiliada da Rede Globo. Num desses processos, se quer impedir o jornalista de publicar qualquer informação acerca da família Maiorana, o que configuraria censura prévia.


Isso também motivou a Rede de Jornalistas Ambientalistas Brasileiros, a Rede de Jornalistas da Amazônia (Cipó) e a Ong Ecologia em Ação a organizar uma “ciberação” contra as “perseguições e injustiças em represália à sua determinação de buscar a verdade no cumprimento dos preceitos universais do jornalismo”.

Essas entidades divulgaram uma carta dirigida ao grupo Organizações Romulo Maiorana (ORM), às Organizações Globo, à OAB-Nacional, à OAB-Pará, ANJ e ao Tribunal de Justiça do Pará, pedindo, em defesa da liberdade de imprensa no Brasil, a interrupção imediata da perseguição, por meio de processos judiciais, que tem impedido Lúcio Flávio Pinto de viajar, de trabalhar e, eventualmente, de viver.

(*) Elias Pinto é colunista do jornal Diário do Pará

PALAVRAS, PALAVRAS

O portal UOL até que enfim alterou o texto da reportagem do jornalista Jens Glüsing, da publicação alemã Der Spiegel. Na tradução do inglês para o português, feita por Luiz Roberto Mendes Gonçalves, era afirmado que "a Ministra do Meio Ambiente [Marina Silva] gosta de caçar".

O equívoco, apontado por este blog, motivou uma manifestação de Glüsing:

- Na tradução para o inglês, que sirviu como base para a tradução ao português, eles usaram a palavra "Minister", uma palavra que não tem sexo, por isso o tradutor provavelmente achou que eu me referia a Marina Silva. Eu sinto muito este erro, mas realmente não era nem é minha intenção de falar que Marina Silva é caçadora. Espero que a UOL corrija este erro na tradução".

O trecho corrigido da reportagem "Combatendo o crime e o alcoolismo na Amazônia" sobre o parque Tumucumaque agora está assim:

"O emprego certamente tem seus riscos. Os que processam os agressores do meio ambiente muitas vezes se transformam nos próprios caçados. Um dos empregados de Jaster quase foi atropelado depois de aplicar uma multa a um criador de gado. O próprio Jaster já recebeu ameaças. E os políticos não costumam ajudá-lo: o governador do Amapá vem de uma família de comerciantes de madeira; o secretário de Meio Ambiente gosta de caçar; e o único membro do Partido Verde no estado se manifestou a favor do garimpo na região protegida, porque isso dá votos".

Quem deve agora uma explicação é o Secretário de Meio Ambiente do Amapá.

terça-feira, 22 de novembro de 2005

FALTA SOLIDARIEDADE

Estou perplexo com um fato: em que pese as notas, cartas, mensagens e reportagens veiculadas em Repórteres Sem Fronteiras, Comunique-se, Observatório da Imprensa, Rede Ecoa, blogs e quejandos, até agora não chegou a 200 os signatários da carta divulgada ontem em solidariedade ao jornalista paraense Lúcio Flávio Pinto.

O que há? Certeza de que essas campanhas diletantes são inconsequentes? Medo de ser identificado pelos destinatários? Falta de solidariedade? Entendimento de que a perseguição imposta ao jornalistta é justa?

Faço esses questionamentos após ler no OI um artigo do jornalista Luciano Martins Costa no qual, após referência a Miguel de Unamuno, ele afirma:

- Os jornalistas, estejam ou não na ativa, deveriam se colocar contra a onda irracional e bradar, como o pensador espanhol: "A imprensa é o templo da inteligência e nós somos seus sacerdotes!"

Lúcio Flávio Pinto esteve com Chico Mendes 15 dias antes do assassinato do seringueiro. Chico sabia que, voltando ao Acre, seria assassinado e não queria voltar, mas teve que voltar.

A dramaticidade do jornalista é inversa à do seringueiro: se sair, em momentos críticos poderá ser preso. A grande imprensa brasileira passa ao largo do infortúnio dele, como fez em relação a Chico Mendes.

Unamuno afirmou que "há momentos em que silenciar é mentir". Afinal, estamos sendo sacerdotes de quem mesmo?

Compartilho a mensagem de Maíra Pinto, uma sobrinha de Lúcio que mora em Salvador:

- Ele está sempre preocupado em defender o que acha ser o correto. Mas o que mais admiro nele é a maneira como defende até o fim aquilo que acredita. Espero que o seu fim não seja por causa disso.

Lúcio Flávio Pinto não estava hoje em Nova Iorque para receber o prêmio concedido pelo Comitê para a Proteção dos Jornalistas. Segue o relato da entidade sobre a delicada situação do jornalista:

Jornalista brasileiro é refém de processos punitivos

Um destacado jornalista brasileiro que foi laureado pelo Comitê para a Proteção dos Jornalistas (CPJ) com o prestigiado Prêmio Internacional da Liberdade de Imprensa não poderá participar da cerimônia de entrega dos prêmios que ocorrerá este mês, por causa de uma série de processos punitivos que o transformam em virtual refém na cidade amazônica onde mora.

"Hoje se tornou indispensável que eu esteja em Belém acompanhando meus 18 processos ativos, em andamento. Tenho que prestar a máxima atenção aos detalhes, às filigranas dos processos… Sou, na verdade, um prisioneiro domiciliar de fato, embora não de direito", disse Lúcio Flávio Pinto, editor do jornal quinzenal Jornal Pessoal.

Ele disse que os demandantes – que incluem poderosos juizes, donos de meios de comunicação, políticos e empresários incomodados com sua incisiva cobertura – estão usando todas as vias legais "até que eu me veja compelido a ser preso".

O CPJ condenou hoje a perseguição legal sistemática a Pinto, baseada na anacrônica Lei de Imprensa de 1967, adotada sob o regime militar, mas que é constitucionalmente dúbia atualmente. O CPJ urge o governo federal brasileiro a entrar com uma ação direta de inconstitucionalidade junto ao Supremo Tribunal Federal, que tem a autoridade de anular esta lei usada por demandantes poderosos para silenciar não somente Pinto, mas jornalistas em todo o país.

Pinto, que vive na cidade de Belém, no estado amazônico do Pará, tem noticiado sobre tráfico de drogas, devastação ambiental, e corrupção política e empresarial. Como conseqüência, ele tem enfrentado ameaças, ataques e é alvo de dezenas de ações civis e penais por difamação. Ele disse que os 18 processos civis e criminais por difamação em andamento têm, em comum, dois elementos: estão baseados na infame Lei de Imprensa brasileira, de 1967, que prevê penas severas, incluindo prisão; e todos derivam de matérias envolvendo assuntos de interesse público.

"É vergonhoso que este grande jornalista brasileiro tenha se tornado prisioneiro em sua cidade, incapaz de sair por medo destas ações legais punitivas", disse a Diretora do CPJ, Ann Cooper, em Nova York. "O objetivo desses processos é censurar um dos grandes repórteres do país, violando a garantia constitucional brasileira. O governo federal deve agir para garantir que as proteções constitucionais tenham significado prático".

Em reconhecimento por seu corajoso trabalho, o CPJ nomeou Pinto um dos ganhadores do Prêmio Internacional de Liberdade de Imprensa de 2005.

Profusão de audiências no tribunal e de prazos finais

As datas das audiências associadas aos processos contra Pinto o impedem de viajar para fora de sua cidade; perder uma única audiência ou prazo final, disse ele, o coloca sob o risco de prisão. Por causa do número de processos, Pinto disse ao CPJ que devota mais de 80 por cento de seu tempo a sua defesa em tribunais, deixando pouco tempo para o seu trabalho em um projeto de livro ou para o Jornal Pessoal, fundado por ele em 1987. Pinto precisou defender-se pessoalmente porque advogados temem representá-lo contra poderosos demandantes.

"Pelo menos três vezes por semana vou ao fórum de Belém. Permaneço constantemente em pesquisa de material jurídico e participando das peças de elaboração da minha defesa. É meu maior trabalho atualmente, o que mais tempo me absorve. Há períodos em que minha vida se resume a atender às demandas judiciais", disse Pinto.

O pesquisador do CPJ para as Américas, Sauro González Rodríguez, viajou a Belém para se encontrar com Pinto e verificar o registro dos processos. A análise do CPJ revelou um padrão de casos impetrados por demandantes ricos e influentes incomodados com sua cobertura crítica.

** Pinto enfrentou duas ações penais e uma civil, impetradas por Cecílio do Rego Almeida, derivadas de uma série de artigos que Pinto publicou no Jornal Pessoal em 1999 e 2000, descrevendo a apropriação de terras ricas em madeira na Floresta Amazônica por companhias controladas por Rego Almeida, dono da Construtora CR Almeida, e seus filhos.

** João Alberto Paiva, desembargador aposentado do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, entrou com uma ação civil e duas penais contra Pinto por dois artigos publicados em 2000, nos quais Pinto criticou o desembargador por conceder uma liminar que restabeleceu o controle temporário de terra disputada pelas autoridades brasileiras para uma companhia controlada por Rego Almeida.

** Pinto enfrenta mais de 10 ações civis e penais por difamação apresentadas por membros da família Maiorana, proprietária do diário O Liberal, baseado em Belém, além do grupo de comunicação Organizações Romulo Maiorana. O grupo de mídia também é proprietário da TV Liberal, afiliada local da Rede Globo, a maior rede nacional de televisão do país, e uma estação de rádio. Pinto escreveu vários artigos sobre a família Maiorana e a história das Organizações Romulo Maiorana. Um dos artigos alegava que o grupo de mídia usava sua vasta influência para pressionar empresas e políticos a comprarem espaço publicitário nas empresas de mídia do grupo. Dois membros da família Maiorana pediram ao tribunal que proibisse Pinto de escrever novamente sobre eles ou suas empresas no Jornal Pessoal.

Pinto foi condenado três vezes no tribunal penal e considerado responsável uma vez na corte civil. Uma condenação foi anulada; os outros casos estão com recursos de apelação pendentes. Pinto ainda é réu primário, o que significa que ele tem direito à suspensão de sua prisão em sua primeira condenação. Mas, se alguma condenação for confirmada na apelação, a próxima pode levá-lo à prisão com sentença de até três anos.

Lei da ditadura sobrevive

A Lei de Imprensa de 1967 parece contrariar diretamente a Constituição brasileira, que garante a liberdade de expressão e proíbe a censura. A Lei de Imprensa, remanescente arcaica da ditadura militar, define alegadas violações em termos amplos como: reportagem ofensiva à moral pública, reportagem que o demandante acredita ser danosa a sua reputação ou ofensiva a sua dignidade; reportagem considerada subversiva à ordem pública e política; e reportagens sobre fatos "reais" consideradas distorcidas ou provocativas.

Processos penais e civis por difamação contra a mídia brasileira atingiram as centenas nos últimos cinco anos, de acordo com a imprensa. Empresários, políticos e funcionários públicos perpetraram várias ações contra meios de comunicação e jornalistas como meio de pressioná-los, drenar seus recursos financeiros, e forçá-los a conter suas críticas.

Demandantes pedem quantias financeiras desproporcionalmente altas a título de "danos morais e materiais", uma prática que se tornou tão comum que é conhecida como "indústria da indenização", de acordo com a pesquisa do CPJ. Os processos são perpetrados sob um clima politizado, em que os tribunais de primeira instância freqüentemente interpretam a lei brasileira de forma a restringir a liberdade de imprensa, de acordo com a análise do CPJ.

Vários processos contra Pinto prescreveram e, ainda assim, juizes se recusaram a encerrar as ações. Em janeiro, Pinto foi fisicamente agredido pelo demandante Ronaldo Maiorana no meio de um restaurante. Embora Pinto tenha registrado a queixa, as autoridades não tomaram providências concretas sobre o caso.

Além das várias penalidades civis, a Lei de Imprensa prescreve termos de prisão que variam entre seis meses e três anos, mais multas. O Código Penal brasileiro também contém várias formas de tratar difamação como crime, fixando penas de seis meses até dois anos de prisão.

Em um sinal encorajador, Edson Vidigal, presidente do Superior Tribunal de Justiça, a segunda mais alta corte brasileira, disse várias vezes em discursos e entrevistas este ano que a Lei de Imprensa foi "implicitamente revogada pela Constituição de 1988". Vidigal, ex-jornalista, disse que a habilidade dos jornalistas cobrirem os fatos está severamente restrita enquanto a Lei de Imprensa permanecer em vigor.

O aprisionamento por ofensas de imprensa tem caído em desuso em todo o continente, mas a perseguição por acusações criminais de difamação continua comum. Em agosto de 2004, a Corte Interamericana de Direitos Humanos anunciou a anulação da condenação pelo delito de difamação, em 1999, do jornalista costarriquenho Mauricio Herrera Ulloa, repórter do diário La Nación. A Corte, baseada na Costa Rica, determinou que a sentença violou sua liberdade de expressão e ordenou à Costa Rica o pagamento de danos do jornalista. O presidente da Corte, juiz Sergio García Ramirez, escreveu um aparte, questionando a criminalização da difamação e sugerindo que leis como esta deviam ser revogadas.

Para contexto e entrevista com Pinto, clique aqui. Para mais informações sobre o prêmio do CPJ, clique aqui.

(*) O CPJ é uma organização independente, sem fins lucrativos, que se dedica a defender a liberdade de imprensa em todo o mundo

MÃO-DE-GATO

Do jornalista Luciano Martins Costa no Observatório da Imprensa:

"O artigo publicado na edição 355 deste Observatório, sob o título "Quando faltam a razão e o direito", produziu um grande número de comentários no Blog do Noblat, panfleto político de responsabilidade do jornalista que, sob a autoridade de Paulo Cabral, dirigiu o processo de inserção do Correio Braziliense no rol dos jornais mais considerados do país nos anos 1990. Essencialmente, muitos leitores-correligionários se escandalizaram pelo fato de o blog ter sido qualificado como "panfleto".

Na verdade, se fosse possível aos manifestantes observar por cima do muro do seu engajamento, eles teriam entendido que, em seu formato mais comum, os blogs são de fato, e geralmente, panfletos, o que não os diminui. No meio da balbúrdia e destemperos postados por leitores, o jornalista acreano Altino Machado observou lucidamente que "muita gente reagiu de modo precipitado por causa da palavra panfleto no artigo. Bobagem, puríssima bobagem. O que significa panfleto? O Aurélio define como "pequeno escrito polêmico ou satírico, em estilo veemente". Os blogs em geral são isso mesmo: coleções de artigos veementes, opiniões, notas selecionadas conforme o gosto do autor, com seus comentários pessoais. Ou são apenas coleções de informes de segunda mão, como clippings eletrônicos, também selecionados conforme as preferências do dono".

Para ler o artigo completo clique em "A mão-de-gato dos blogs".

ADIANTE


O convite acima foi enviado pelo Centro de Estudos em Sustentabilidade da Fundação Getúlio Vargas. A revista Adiante é promessa de inovação para a sustentabilidade. Seu editor é o jornalista Luciano Martins Costa.

TOP SECRET

O servidor de e-mail do Governo do Acre foi hackeado. Os problemas começaram na semana passada, quando um grupo de crackers invadiu os sites da Prefeitura de Rio Branco e da Secretaria Estadual de Meio Ambiente.

A página principal do site não foi afetada porque o governo possui servidores dedicados para e-mail, web e firewaal, fora os outros sistemas de segurança e aplicativos diversos.

A suspeita de que tenha sido os mesmos crackers se baseia no fato de que a assinatura padrão de tais grupos consiste em atacar na mesma área.

Os usuários do webmail do governo têm enfrentado os seguintes problemas: não conseguem acessar suas caixas postais, outros acessam, mas encontram e-mails sem corpo de texto.

Os hackers têm sido confundidos com os grupos de crackers, que também se intitulam hackers, mas na realidade são a encarnação cibernética dos pichadores que dominaram a cena na década de 80.

A ofensiva deles na semana passada foi registrada aqui, na nota "Ataques cibernéticos".
O caso está sendo investigado na tentativa de responsabilizar criminalmente os autores dos ataques.

PRÊMIO ESSO

Repórter Andréa Zílio e o fotógrafo Marcos Vicentti, do jornal Página 20, estão entre os finalistas ao Prêmio Esso Regional Norte com o trabalho "A nova história do povo Yawanawá". O Prêmio Esso de Jornalismo é o mais prestigiado da imprensa brasileira. Os vencedores deste ano, que concorrem em 13 categorias, serão conhecidos no próximo dia 13 de dezembro, durante festa de premiação no Rio.

A Comissão de Seleção dos trabalhos de mídia impressa foi a mais numerosa já reunida nos 50 anos de existência do Prêmio Esso. Para concluir pela indicação de 44 finalistas, foram examinados 1027 trabalhos inscritos, sendo 509 reportagens, séries de reportagens ou artigos; 140 trabalhos fotográficos; 167 trabalhos de criação gráfica em jornal, 90 trabalhos de criação gráfica em revista e 79 primeiras páginas de jornal, além de 35 trabalhos de telejornalismo e 7 inscrições ao Prêmio de Melhor Contribuição à Imprensa.

Também concorrem ao Prêmio Esso Regional Norte Jaqueline Almeida, com o trabalho "Escravas no Suriname", publicado no jornal O Liberal, e Antonio Ximenes, Cláudia do Valle, Cristiane Silveira, Gerson Severo Dantas, Joana Queiroz, Júlio Pedrosa, Márcia Guimarães, Mazé Mourão, Neuton Corrêa, Omar Gusmão e Síntia Maciel, com o trabalho "Sequestro-relâmpago", publicado no jornal A Crítica.

Clique em "A nova história do povo Yawanawá" para ler a reportagem de Andréa Zílio e, em galeria, para ver mais fotos do Marcos Vicentti.

MUDE O CLIMA


Olá Altino, sou assessora de imprensa do Greenpeace, e estamos com uma nova campanha virtual para combater as mudanças climáticas. Se você quiser divulgar no seu blog, o link é Mude o Clima.

Abraços

Gabriela Michelotti
São Paulo - SP

segunda-feira, 21 de novembro de 2005

DEMOCRATIZAR A COMUNICAÇÃO


Por Lígia Kloster Apel

Caros novos amigos e novas amigas, é com alegria e uma certa apreensão que escrevo para o Blog do Altino. Em primeiro lugar, é claro, preciso me apresentar.

Sou Lígia Kloster Apel, trabalho com comunicação e estou chegando em Rio Branco. Já andei por alguns interiores desse nosso Brasil buscando, assim como muitos bons brasileiros, um lugar ao sol - coisa que não é tão fácil num país onde seu povo e suas riquezas estão à mercê de monopólios, oligopólios, cartéis e indústrias culturais. Mas já disse e repito: sou boa brasileira e não desisto nunca (fazendo menção a um dos poucos jargões governamentais que concordo, extraído aliás, do próprio povo brasileiro).

Chegando em Rio Branco, mais uma vez eu comprovo que o Brasil é o melhor país pra se viver. Sua riqueza natural e cultural é única em toda sua inerente diversidade. Ô terra linda, ô gente bacana! Cheguei aqui e aqui fui recebida com carinho, com respeito, de braços abertos por tanta gente, o que é muito fácil num país de povo acolhedor e amigo, digno e lutador, empático por excelência.

Assim fui recebida por tantos. E também por Altino e alguns de seus amigos. Obrigada a todos vocês, e em especial a você Altino, que proporcionou a ampliação da minha roda de amigos. Sinto-me em casa e, saibam, retribuirei a empatia de vocês, aprendendo e contribuindo em tudo o que estiver ao meu alcance com a construção da florestania no Acre.

E falando em solidariedade, quero aproveitar a oportunidade e me solidarizar com Diogo Soares, Kilriu Farias e Saulinho Machado na indignação que sentiram com a entrevista que concederam ao apresentador da TV Rio Branco, Jorge Said, cuja conduta assumida na ocasião está relatada em "Mediocridade na TV", publicada neste blog.

Infelizmente, vi desses prestadores de desserviço em muitos lugares por onde andei. Dá dó. São meros fantoches nas mãos daqueles que detém o monopólio da mídia. E pior: se contentam com isso. Acho que pior ainda: armam-se contra qualquer menção à possibilidade de democratização da comunicação.

E isso é de indignar mesmo. Enquanto milhares de rádios comunitárias Brasil afora são fechadas violentamente só porque querem uma licencinha para operar com 25 quilos de potência e poder falar com seus amigos, em sua própria comunidade, mostrando a sua arte, a sua vida, veículos elefantes-brancos operam com o máximo de potência para escoar esse tipo de postura pelas nossas casas.

Diogo, Kilriu, Saulinho e todas as pessoas livres, criadoras e sensíveis que modelam o belo e exaltam o sublime, não precisamos desses espaços de divulgação para nossos trabalhos. Temos inúmeras formas de mostrar ao mundo o que fazemos. As pessoas têm critérios refinados para valorizar e/ou repudiar. O banal, por mais que a indústria cultural insista em disseminar, é efêmero.

Enquanto que nós, cultura legítima que recria sua poesia do âmago, do útero, do centro, da essência, somos imortais. Nosso espaço nas sociedades, e nos indivíduos que compõem essas sociedades, nunca nos será tirado, nunca seremos substituídos nas mentes e nos corações.

Cantamos o mistério da vida e ele, como já dizia Einstein, me causa a mais forte emoção. É o sentimento que suscita a beleza e a verdade, cria a arte e a ciência. Se alguém não conhece esta sensação e não pode mais experimentar espanto ou surpresa, já é um morto-vivo e seus olhos estão cegos.

Tenho uma certeza: democratizando a comunicação teremos mais e mais forças para que mais e mais pessoas cantem os mistérios da vida.

Um forte abraço a todos e, mais uma vez, obrigada pela acolhida.

Nota do blog: Foi meu amigo André Mugiatti, jornalista que assessora o Greenpeace na Amazônia, quem fez a ponte deste blog com
Lígia Kloster Apel, assinalando sua vasta competência profissional em comunicação comunitária. Lígia é curitibana formada em comunicação social, habilitação em rádio e TV. De sua experiência profissional, destaco a Rede de Repórteres Comunitários do Instituto IARA, a Rede de Repórteres Educativos do Projeto Rádio pela Educação, além da Estação Digital Muiraquitã - respeitado projeto de inclusão digital em Santarém (PA), que envolve, entre outros, o Grupo de Defesa da Amazônia e o Centro de Apoio a Projetos e Ação Comunitária. Há três meses no Acre, Lígia já enviou, como correspondente da Rede Cyberela, boas reportagens sonoras sobre meio-ambiente, que podem ser acessadas no site Rádio Fala Mulher. E quem quiser saber mais a respeito dela, vá ao Google. Seja bem-vinda, Lígia.

MARINA SILVA



A ÚLTIMA CARTADA


Cristina Ávila (*)
Do Eco

Ninguém espera que ministro do Meio Ambiente, no Brasil, tenha vida fácil. O assunto está no fim da fila das prioridades administrativas, políticas e orçamentárias, além de não render voto.

Ainda assim, no início do governo Lula criou-se grande expectativa em torno da atuação de Marina Silva, senadora do PT e ambientalista respeitada por sua atuação no Acre.

Chegando ao fim do terceiro ano de sua gestão, ela coleciona mais derrotas do que vitórias à frente da política ambiental brasileira. Transgênicos, hidrelétricas e grandes obras de infra-estrutura atropelam as tentativas de precaução ambiental. Resultado: sobra para a ministra. Em vários momentos de impasse, foi dito que Marina Silva estava enfraquecida e sairia a qualquer momento. Mas ela seguiu em frente, com estilo manso e discurso conciliador.

Para coroar sua atuação com uma conquista de peso, Marina aposta tudo no projeto de lei que abre concessões para a exploração econômica das florestas públicas. Aprovado na Câmara, o PL estancou num impasse político que parece não ter fim, e já cheira a gaveta, às vésperas de ano eleitoral. “O problema hoje é o PFL”, ela reconhece. E não tem resposta pronta sobre os rumos da política para a Amazônia, caso seu principal projeto seja arquivado. “Pergunte ao Congresso”, esquiva-se.

Num vôo de 40 minutos, entre Porto Alegre e Bagé, no Rio Grande do Sul, Marina Silva concedeu esta breve entrevista a O Eco, analisando os embates de sua gestão.

Por que é preciso liberar a exploração das florestas públicas?

Marina Silva - É fundamental. Se a floresta em pé é rentável, é claro que se vai evitar que se derrube para outras atividades. Estamos aproveitando experiências já desenvolvidas por movimentos sociais e instituições de pesquisa que iniciaram a trajetória de manejo, principalmente no Acre e Pará, inclusive a Embrapa. Temos uma economia florestal, temos a maior floresta tropical do mundo e mais de 80% da madeira do país vem dessa floresta. E nunca se pensou em fazer uma lei para regulamentar o uso das florestas públicas, que eram simplesmente griladas e garimpadas ao longo de todos esses anos.

A senhora ainda acredita que a lei seja votada este ano?

Marina Silva - Tudo o que podia ser feito, foi feito. O PFL é que não concorda em botar a lei em votação. Não sei qual é o problema, já que não se trata mais de uma questão de mérito. O próprio líder do PFL, senador José Agripino, foi relator da matéria na Comissão de Mérito. Ela foi aprovada em todas as comissões, agora está no plenário. Mas eles estão impondo resistência.

Isso tem a ver com o momento de fragilidade do governo?

Marina Silva - Eu espero sinceramente que não. A Amazônia está acima dos problemas políticos. Por isso eu pedi ajuda para todo mundo. Pedi ajuda para o ex-presidente Fernando Henrique, para ele conversar com o PSDB. Ele me disse que ligou para o deputado [Alberto] Goldman. Foi assim que o projeto foi aprovado na Câmara. Conversei com todos os partidos. No Senado, conversei com o senador Artur Virgílio. O senador Jefferson Perez, muito embora seja de oposição, é um homem que sabe o quanto isso é importante para a Amazônia. O problema hoje é o PFL, e eu não consegui alcançar do que se trata.

A senhora esperava tantas dificuldades à frente do Ministério?

Marina Silva - Quando aceitei o convite do presidente Lula para ser ministra, sabia que não seria fácil. Claro que quando a gente se depara com a estrutura em si, percebe que existe uma trajetória muito grande a ser seguida, que é a implementação da lei. Os meus antecessores, como [José] Lutzenberger e o dr. Paulo Nogueira Neto, desde a Secretaria Nacional de Meio Ambiente, contribuíram na criação do marco legal para o país. O desafio agora é implementar a legislação já existente e criar outras que passem a trabalhar a questão do uso dos ativos ambientais, em base sustentável. Não se trata apenas da regulação do que pode ou não, mas de como pode. E, quando não pode, deve ser aplicada a lei.

Por que é tão difícil aplicar a lei?

Marina Silva - Quando você está fazendo a lei, a maior parte das pessoas recebe isso como algo positivo, ainda não caiu a ficha de que aquilo pode ferir alguns interesses setoriais. Quando você tem a tarefa de implementar a lei, aí as pessoas começam a verificar: “Opa, então esse negócio significa que eu não posso fazer a hidrelétrica de qualquer jeito, que não posso fazer a estrada de qualquer jeito?”. Isso significa ferir determinados interesses imediatistas que no processo da feitura da lei não são tão visíveis.

O combate ao desmatamento na Amazônia ainda está aquém do desejado?

Marina Silva – É meu maior desafio. Em 2001/2002, o desmatamento chegou a crescer 27%. A questão ambiental era tratada só pelo Ministério do Meio Ambiente, querendo segurar ações predatórias, e quando chegava o momento da divulgação do índice ele tinha que, sozinho, fazer o anúncio. Sem que os setores que causam impacto ambiental, na área de infra-estrutura e de agricultura, tivessem qualquer envolvimento. Quando assumimos o governo, 13 ministérios passaram a se empenhar no combate ao desmatamento. Operações da Polícia Federal, Ministério Público e Ibama resultaram na prisão de 186 pessoas, inclusive servidores públicos...

Mas demora.

Marina Silva - Avisamos que não faríamos pirotecnia, que íamos criar uma coisa que demorava, mas seria consistente. Criamos, junto com o Ministério de Ciência e Tecnologia, um sistema de detecção do desmatamento em tempo real dando total transparência a uma informação que as pessoas só tinham em números secos. As imagens de satélite são disponibilizadas na internet. Esse esforço fez o desmatamento sair de um crescimento de 27%, em 2002, para uma queda de 40% em 2005.

Obras como a BR-163 (Cuiabá-Santarém) não são um estímulo ao desmatamento?

Marina Silva - A BR-163 poderia ser feita no governo anterior, sem política de desenvolvimento sustentável, no coração da Amazônia, com desmatamento crescendo a 27%. Paramos o processo de licitação para a construção, sugerimos ao Ministério dos Transportes um Plano de Desenvolvimento Sustentável da BR. Isso nunca foi feito na história deste país: o setor ambiental chegar para os governadores, prefeitos, para o ministro dos Transportes, e dizer “A estrada só pode ser feita se forem criadas unidades de conservação, demarcada a terra indígena”. Se o setor de Transportes vai fazer a estrada, é uma questão de priorizar recursos. Mas o arranjo social, ambiental e econômico foi feito, por um conjunto de 18 ministérios.

Em meio a embates...

Marina Silva - Não vejo isso como embate. Cumprimos com a função de fiscalizar, de controlar, ao mesmo tempo em que se coloca para os demais setores de governo que devem estar preocupados com o critério de sustentabilidade. Vejo isso como a construção de um novo processo, que é difícil, tensionado, e precisa capacidade de diálogo. Sem preocupação com a imagem. Se você acumulou credibilidade pelo trabalho já feito, tem que usar essa credibilidade para continuar fazendo coisas. Senão você morre empanzinada com a sua credibilidade.

Qual foi sua maior briga dentro do governo?

Marina Silva - Um embate público foi a questão dos trangênicos. O Ministério do Meio Ambiente propunha uma lei que possibilitasse a coexistência de trangênico e não-trangênico. Isso só é possível se tiver licenciamento ambiental, rastreabilidade, se tiver segregação na hora do beneficiamento, no transporte. A lei aprovada foi excessivamente permissiva. Tivemos uma disputa, não se pode confundir com inimizade. Mas, de fato, o Ministério do Meio Ambiente foi derrotado, foi derrotada a legislação ambiental, a Constituição Federal e todos os acordos que o Brasil assinou. Da Convenção da Biodiversidade ao Protocolo de Cartagena, que preconizam a precaução.

Como a senhora lida com tantas críticas?

Marina Silva - O Brasil não me conhecia antes. No meu estado, eu era criticada 24 horas pelo que eu fazia. Vi várias pessoas ligadas a mim não só serem criticadas, mas morrerem. Fiquei durante quatro anos sem poder andar na metade do meu estado, sob pena de ser linchada. Eu era contra o desmatamento e contrariava uma série de interesses. Chegaram a fazer uma campanha de que eu era contra o desenvolvimento. Não podia sequer dar minha versão nos meios de comunicação. O que se faz não é para aparecer, se cacifar para alguma coisa. Sempre fiz o que era justo, mesmo quando não rendia simpatia e voto.

Se o Projeto de Lei das Florestas Públicas não passar no Senado, como fica a política para a Amazônia?

Marina Silva - Essa é uma boa pergunta para se fazer ao Congresso Nacional. Os criminosos estão sendo punidos. Os produtores corretos precisam da lei para viabilizar seus empreendimentos. E os que fazem errado porque não tiveram alternativa querem se legalizar. A bola está na mão do Congresso em relação à política florestal.

* Cristina Ávila é jornalista freelancer em Porto Alegre e tem 25 anos de profissão.